PL 2633 (Regularização Fundiária): risco alto pede mais debate

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Por WWF-Brasil

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MP 910 legalizava e incentivava grilagem

O PL 2633, sucessor da MP 910, que trata da regularização de ocupações particulares em terras públicas, pode ser votado nesta semana. O WWF-Brasil vem a público manifestar sua preocupação com a possibilidade de votação da matéria em regime de urgência, sem que aprimoramentos fundamentais sejam feitos e, sobretudo, com risco real de que problemas graves, que efetivamente premiam a induzem a grilagem de terras públicas, retornem ao texto numa votação açodada.

O texto do PL 2633 avança na resolução de uma parte dos problemas apresentados pela MP 910, em sua versão original apresentada pelo presidente Jair Bolsonaro, assim como nos relatórios propostos pelo senador Irajá Abreu. Foi uma vitória da sociedade mostrar ao Congresso que essa MP era contra os melhores interesses do Brasil e iniciar um diálogo para um texto que seja mais justo.

Nesse sentido, o PL não altera o marco temporal para legalizar ocupações, não permite regularização para pessoa jurídica e limita a 6 módulos fiscais o tamanho das áreas que podem ser legalizadas sem vistoria – todos itens de atenção nas versões citadas. Mas embora limite, ele não elimina os benefícios indevidos a grileiros. E ainda inclui problemas sérios a serem resolvidos.  

A votação em regime de urgência, além de impedir os necessários aprimoramentos, ainda traz o sério e palpável risco de voltar ao projeto pontos muito graves. Se isso ocorrer, o Parlamento brasileiro estará ajudando a manchar de vez a imagem do país como um exportador de commodities agrícolas produzidas de forma social e ambientalmente responsável. Estará premiando ladrões de terras públicas quando deveria estar cuidando do alívio às famílias mais vulneráveis às crises econômica e sanitária trazidas pela COVID-19.

Tal como está, o PL 2633:
•    fragiliza o cumprimento da lei ambiental após a regularização, alterando a atual regra que obriga a resolução do título de propriedade no caso de descumprimento da legislação ambiental (art.15, §10);
•    anistia aqueles que praticam desmatamento ilegal, mas não foram condenados em processo administrativo (apenas 4% dos desmatamentos ilegais resultam em condenação administrativa);
•    amplia pela terceira vez, em menos de 10 anos, o prazo de renegociação dos contratos de regularização fundiária, premiando mais uma vez os inadimplentes e tornando pouco críveis as condições ali estabelecidas

Mesmo reconhecendo avanços, é certo que o projeto precisa de muitos aprimoramentos para que efetivamente seja uma proposta equilibrada, que contribua com a regularização fundiária no país, separando o joio do trigo, o grileiro do produtor rural de boa-fé.

Sabemos que para beneficiar os pequenos ocupantes de terras públicas (97% do total que aguarda titulação) não é necessária uma nova legislação, mas sim destinação de recursos humanos e financeiros aos órgãos fundiários (atualmente o Incra). Já foram titulados 18 mil imóveis pelo MDA e Incra desde a edição da Lei Federal 11952/09, outros tantos por meio de convênios com órgãos estaduais, processo que foi fortemente desacelerado após a aprovação da Lei Federal 13465/09, por mudanças na gestão federal, e praticamente paralisado na atual gestão do Incra, que está novamente pedindo mudança nas regras – para os grandes ocupantes.

Fortalecer o Incra é fundamental para que o processo possa deslanchar e atender quem merece, mas isso não está na proposta. Qualificar o crime de invasão de terra pública para que haja punição efetiva aos criminosos é também uma necessidade premente, mas a proposta em nada trata disso. Criar regras modernas e eficazes para que a destinação de terras públicas seja feita de forma planejada, respeitando a vocação da terra e fugindo do sistema de legalização do fato consumado é talvez a demanda mais urgente que temos, mas o projeto não aborda o tema. Garantir transparência ao processo de regularização, para que exista controle da sociedade à destinação do patrimônio público, é um outro tema que demanda solução urgente e não é sequer abordado no projeto. Para que esses e outros pontos fundamentais possam estar presentes é necessário um debate mais amplo e qualificado com a sociedade, algo que não foi possível durante a tramitação da MP 910 e tampouco é crível que aconteça durante a maior pandemia enfrentada por nossa sociedade em gerações, num momento no qual o Congresso Nacional precisa efetivamente se debruçar sobre questões emergenciais.

Por todas essas razões, o WWF-Brasil solicita aos líderes partidários, em especial ao relator Marcelo Ramos, que permita que o tema seja debatido com a profundidade e seriedade que merece. Temos certeza de que, com determinação e espírito público, é possível transformar um projeto nascido para premiar quem descumpriu a lei em outro que possa realmente endereçar o problema de roubo e malversação do patrimônio público, preservando o direito dos produtores de boa-fé, bem como das comunidades tradicionais. Votar o projeto agora é um equívoco.

MP910 legalizava e incentivava grilagem
A MP 910, em sua versão original assinada pelo Presidente Bolsonaro, assim como nos relatórios propostos pelo Senador Irajá Abreu, era efetivamente uma proposta para legalizar grandes grileiros, não para atender o justo anseio de pequenos produtores rurais que aguardam há décadas a entrega de título de propriedade da terra na qual produzem. Isso porque, dentre outros, ela propunha:
•    Anistiar quem invadiu e desmatou ilegalmente terra pública até dezembro de 2018, ou seja, 7 anos após a data limite da legislação atual (2011). Seria a segunda modificação nessa data em 3 anos (em 2017 a data passou de 2004 para 2011). Não se tratava, portanto, de regularizar posses antigas, mas de invasões recentes.
•    Dispensar de vistoria não apenas as pequenas ocupações (97% dos que aguardam titulação), como previsto na legislação atual (Lei Federal 11952/09), mas também áreas de até 1650 ha. Relatório de Irajá Abreu previa que mesmo as ocupações muito grandes (2500 ha) pudessem ganhar o título sem qualquer checagem de campo para verificar a veracidade das afirmações feitas pelo requerente.
•    Conceder título a quem já tem outros imóveis rurais ou invadiu terra pública em diversos lugares, não apenas àquele que encontrou na ocupação daquela parcela de terra pública a única forma de sobreviver e produzir.
•    Conceder título àqueles que já invadiram e obtiveram título de propriedade sobre terra pública, mas venderam o imóvel regularizado. Ou seja, legalizava o negócio de invasão e venda do patrimônio público.
•    Permitir titular área de até 2500 hectares a pessoa jurídica, sem licitação, algo que até então só era possível para pequenos produtores (alteração ao artigo 17, §2-B, II da Lei 8666).

Crédito: WWF Brasil

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