Saneamento, de bem com a vida #19: Quem regula no Brasil: o privado ou o público?

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Álvaro Costa é engenheiro civil e consultor. Escreve como Colunista do editorial AMBIENTAL MERCANTIL ÁGUAS E SANEAMENTO
Álvaro Costa é engenheiro civil e consultor. Escreve como Colunista do editorial AMBIENTAL MERCANTIL ÁGUAS E SANEAMENTO

Imagem: Divulgação | Álvaro José Menezes da Costa, Engenheiro Civil, MSc em Recursos Hídricos e Saneamento, CP3P, contribui com insights valiosos sobre o setor de Águas e Saneamento em sua coluna, enriquecendo o editorial da AMBIENTAL MERCANTIL

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STADLER

Outubro de 2024 – Tanto no setor de saneamento básico quanto no de energia elétrica, como se verifica agora em São Paulo, as lições de casa que deveriam ser feitas no Brasil a partir dos exemplos existentes, cedem lugar a busca de lições de outros países e seus exemplos para tentar “corrigir” o que já é tipicamente brasileiro, posto que, desde o final do século passado e, aí sim, tendo se buscado exemplos de outros países, o Brasil já tem maturidade suficiente para tratar de concessão de serviços públicos e da regulação destes.

O caso ENEL em São Paulo – que bem poderia se chamar caso ANEEL – está sendo utilizado oportunisticamente para comparação com a recente privatização da SABESP, quando na verdade os casos diferem em essência e conceito, porém, merecem destaque pela questão regulatória envolvida. Tanto para a ENEL como para a nova SABESP – o autor usa esta forma de identificação por ser recente a conhecida mudança na empresa – a existência de instrumentos regulatórios que enderecem seu uso para possibilitar a defesa do cliente e a sustentabilidade do serviço e do contrato, deveriam ser ou são, o ponto principal do processo de gestão de um contrato de concessão.

A ENEL atua sob um contrato de concessão federal, afetado por características mais nacionais que locais, enquanto a nova SABESP possui contratos de concessão assinados com os municípios, porém com uma agência reguladora centralizada, a ARSESP, embora existam outras agências em São Paulo que atuam também no setor de saneamento.

Desde 2003 as agências reguladoras, notadamente as de caráter econômico e técnico, passaram a ser questionadas muito mais pelos seus regulados e o próprio governo federal, que pelos normalmente desamparados cidadãos usuários dos serviços regulados. Como a preocupação sempre foi com a segurança jurídica para os concessionários, o lado mais fraco, do cidadão que paga a conta, ficou mais desprotegido. Entretanto, apesar das dificuldades, houve avanços e há alguns benefícios para o cidadão.

A questão central tanto para as agências nacionais como para as infranacionais com obrigação de fazer regulação econômica, técnica e fiscalizar a prestação dos serviços, está na sua gestão ou na sua sustentabilidade institucional.

A lei federal das agências reguladoras, nº 13.848/2019, define de modo claro e extensivo no geral a qualquer tipo de agência reguladora que:

“Art. 3º A natureza especial conferida à agência reguladora é caracterizada pela ausência de tutela ou de subordinação hierárquica, pela autonomia funcional, decisória, administrativa e financeira e pela investidura a termo de seus dirigentes e estabilidade durante os mandatos, bem como pelas demais disposições constantes desta Lei ou de leis específicas voltadas à sua implementação.”

No entanto, bem mais que isto é necessário e importante que os contratos de concessão e seus anexos pertinentes, precisam estar alinhados com os princípios regulatórios para que a agência possa exercer seu papel regulador e fiscalizador.

Hoje, em alguns, talvez muitos casos, encontram-se contratos que mais parece terem sido elaborados para “driblar” a agência reguladora.

Os problemas também não estiveram ou estão apenas do lado dos contratos, pois muitas agências funcionam – às vezes nem funcionam – de modo precário, sem autonomia institucional e administrativa, sem capacidade técnica e operacional e subordinadas a determinações muito mais partidárias que políticas no bom sentido. Ou seja, segue-se repetindo os mesmos erros com pessoas diferentes, já que as agência não possuem em geral o básico que é autonomia.

Voltando a indevida conexão entre a nova SABESP e o caso ENEL, a que se considerar que o modelo regulatório adotado para a prestação dos serviços pela nova SABESP criou formas mais efetivas de fiscalização pela ARSESP e também pelos municípios, para acompanhar e medir os indicadores de desempenho e investimentos, conectando-os, para que haja mais empenho em favor da arrojada meta de 2029. Isto não significa que o futuro para os serviços de saneamento contratados junto a nova SABESP estejam com sucesso garantido, é preciso fiscalizar e regular conforme a lei, os contratos e as obrigações do poder público.

O caso ENEL expõe novamente a falha do poder público naquilo que segue sendo seu maior ponto fraco: fiscalizar e gerenciar. É claro que sem analisar o contrato da ENEL em fase final, não há erro grave em dizer que a ENEL fez o que estava no contrato de modo factual e o poder público, neste caso a ANEEL, nos limites de suas atribuições e limitações de autonomia, cumpriu seu papel de notificar e multar sem corrigir as causas dos problemas.

As lições de casa brasileiras podem sem dúvidas mostrar que para a nova SABESP não se transformar na atual ENEL, é preciso que as pessoas hoje não repitam os erros de sempre, pois fiscalizar, regular e gerenciar os contratos de concessão da nova SABESP é uma indelegável e histórica obrigação do poder público.

A lição de casa é “tupiniquim”: cumprir as obrigações do poder público.

Sobre o colunista

Álvaro José Menezes da Costa é Engenheiro Civil, MSc em Recursos Hídricos e Saneamento, CP3P. Especialista em Aproveitamento de Recursos Hídricos e Avaliação e Perícias de Engenharia; é autor de livro e capítulos de livros publicados sobre Gestão de Serviços e Reúso de Águas.

Álvaro José Menezes da Costa, Engenheiro Civil, MSc em Recursos Hídricos e Saneamento, CP3P
Foto: Álvaro José Menezes da Costa, Engenheiro Civil, MSc em Recursos Hídricos e Saneamento, CP3P

Desde 1985 é membro da ABES- Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental, e desde 2008 atua como diretor nacional. Em 2015 fundou a AMEC – Álvaro Menezes Engenharia e Consultoria, desenvolvendo estudos de modelagem para contratos de PPP, concessão, performance para redução de perdas, engenheiro independente, coordenador e instrutor em cursos de capacitação em regulação e PPP. Contato via LinkedIn.

Site oficial: 
https://www.amecengenhariaeconsultoria.com.br

Álvaro Costa é um colunista que compartilha suas reflexões sobre os setores de água, saneamento e recursos hídricos na AMBIENTAL MERCANTIL. Seus artigos, podem ser lidos neste link exclusivo:

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