Coleta da castanha-do-Brasil ajuda a manter a floresta em pé no Arco do Desmatamento

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A Castanha-do-Brasil é rica em proteínas e vitaminas e é utilizada tradicionalmente na culinária in natura ou em subprodutos como o leite ou óleo. Nos últimos anos, a amêndoa amazônica também virou matéria prima de cosméticos e conquistou o mercado internacional.

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Antes de fazer o produto chegar às mesas e prateleiras mundo afora, porém, é preciso primeiro vasculhar as matas em busca de castanhais nativos, abrir e manter longas trilhas e, depois, identificar, coletar e quebrar o fruto conhecido como “ouriço” – espécie de cápsula muito resistente que guarda em seu interior as castanhas.

Esse trabalho é a rotina diária de pessoas como a ex-técnica de enfermagem Veridiana Vieira, atual presidente da Associação dos Coletores(as) de Castanha do Brasil do Projeto de Assentamento PA Juruena (ACCPAJ), em Cotriguaçu (noroeste de Mato Grosso, a 1.200 quilômetros da capital, Cuiabá).

Ela conta que, quando deixou a cidade e o trabalho em um hospital para se mudar com o marido para o assentamento, sonhava apenas com uma vida mais calma, na qual pudesse tirar o sustento da terra.

“Viemos e fizemos como todo mundo: derrubamos floresta, plantamos capim e criamos gado”, conta.

Após dois anos no local, o casal concluiu que manter rentável a atividade pecuária exigia uma área ainda maior de floresta desmatada, superior ao limite legal de 20% para lotes em regiões florestais da Amazônia – estabelecido desde 2001 e mantido pelo Código Florestal de 2012.

Foi quando decidiram arrancar o capim destinado ao gado e iniciar o plantio da pupunha, espécie amazônica de palmiteiro, alinhado ao cultivo de frutíferas e outras variedades alimentícias, como a mandioca.

“Começamos aí a entender um pouco sobre sistemas agroflorestais”, lembra.

Neste período, Veridiana também trabalhava na Fazenda São Nicolau, gerenciada pela ONF – Brasil (Office National des Forêts), organização que visa a instalação de áreas de reflorestamento para diminuição de emissões de carbono e gestão sustentável das florestas.

Foi lá que ela conheceu um grupo de coletores de castanha-do-Brasil e surgiu o interesse pela atividade, que apresentava resultados promissores por estar localizada em área com planos de manejo florestal madeireiro em vigor.

A partir daquele grupo inicial, foram dados os primeiros passos para a criação da associação, formalizada em 2012.

A ideia veio da vontade dos coletores de criarem uma cooperativa para organizar a cadeia produtiva da castanha.

“Mas vimos que não tínhamos organização o suficiente ainda para criar uma cooperativa, então optamos por uma associação. Precisávamos formalizar para agregar valor com vendas coletivas”, conta.

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Pioneira em um grupo formado por coletores homens, Veridiana conquistou seu espaço e, na segunda eleição, se elegeu como presidente.

“Era uma associação só de homens. Muitos, no início, me enxergavam apenas como a esposa do meu marido. Quando fundaram a associação, não fui registrada como coletora. Não foi nada fácil”, conta a extrativista.

Ela tomou a frente de um movimento que se apresenta como alternativa de renda às famílias do assentamento pela extração de um produto abundante na região. Atividade que não só mantém, como depende da floresta em pé.

ARCO DO DESMATAMENTO

O desafio da ACCPAJ se mostra ainda mais complexo quando se leva em conta que Cotriguaçu está situada na região conhecida como Arco do Desmatamento, área com uma das maiores taxas de desmatamento da floresta amazônica no Brasil.

De acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) de 2018, o município, que tem sua economia baseada na pecuária extensiva e exploração madeireira, teve 22% de sua área florestal total desmatada até o ano de 2015.

Demarcado em 1997, o Projeto de Assentamento (PA) Juruena tem cerca de 500 famílias estabelecidas em 30 mil hectares no município – um estudo do ICV realizado em 2009 mostrou que mais de 40% dessa área havia sido desmatada apenas nos primeiros 10 anos de abertura dos lotes.

Não foi diferente do que se viu em outros assentamentos da região: a derrubada e queimada das matas para instalação de pastagens para gado se mostrava a princípio como uma atividade de baixo custo e rápido retorno, embora insustentável economicamente no médio prazo.

A técnica do Instituto Centro de Vida (ICV), Benedita da Guia Ferreira Mendes, acredita, entretanto, que nos últimos anos alternativas como a coleta das castanhas se apresentam como opções sustentáveis e rentáveis aos assentados.

“É um trabalho constante com as comunidades e com as famílias”, afirma.

UNIÃO DE ESFORÇOS

Com 39 famílias extrativistas associadas, atualmente a ACCPAJ realiza a coleta da castanha em 22 propriedades da região por meio de acordo formais com uma média anual de 150 toneladas de castanhas.

Após a identificação da área com potencial produtivo, os associados propõem ao proprietário a autorização de acesso para coleta e formalizam os acordos, onde os extrativistas também se comprometem com a manutenção, a limpeza das picadas e o monitoramento da área em períodos de seca.

“É para evitar queimadas na floresta ou mesmo invasões de grileiros”, explica Veridiana.

Com isso, dão início ao trabalho, dividido em três etapas. A pré-coleta envolve mapear e selecionar as árvores produtoras do castanhal que será utilizado, quando quebra-se o ouriço e seleciona-se as castanhas. Na pós-coleta, as castanhas são levadas à secagem, armazenamento e transporte para a comercialização.

Os associados são divididos em grupos determinados pela proximidade da moradia às fazendas e que, após a safra, reúnem os resultados das coletas para comercialização conjunta.

Veridiana afirma que as vendas coletivas e os critérios de qualidade estabelecidos pela associação, como o descarte de castanhas cortadas ou de safras anteriores, garantem o escoamento de toda a produção.

“Faz com que a gente estabeleça uma relação de confiança com os compradores, então não temos problemas em vender”, explica.

A associação permite aos extrativistas a negociação com compradores de melhores condições de preços e prazos, além de possibilitar a divisão de custos entre os produtores na compra de equipamentos e materiais para logística e beneficiamento do produto e o acesso a projetos de fomento a práticas produtivas sustentáveis.

A ACCPAJ integra o projeto Redes Socioprodutivas, financiado pelo Fundo Amazônia/BNDES e implementado pelo Instituto Centro de Vida (ICV). Pelo programa, a associação será beneficiada com um barracão de beneficiamento da castanha, atualmente em fase de construção. “A gente emprestava espaço ou a produção ficava em casa de algum coletor, agora isso tudo vai mudar”, comemora a presidente.

PLANO DE MANEJO

Em parceria com o Instituto Centro de Vida (ICV) e com a ONF Brasil, a associação lançou em 2019 o Plano de Manejo Sustentável da Castanha-do-Brasil, o primeiro plano de manejo florestal não madeireiro de Mato Grosso e que tem entre seus objetivos a melhoria da identificação das áreas de coleta da castanha, o reconhecimento do padrão de produção da espécie, melhoria do acesso às áreas e estimativa da produtividade dos castanhais na busca pela consolidação da extração sustentável do produto.

Possível pela união entre conhecimento tradicional extrativista e inovações tecnológicas no mapeamento dos castanhais, o plano se aplica à Fazenda São Nicolau em uma área de cerca de 540 hectares que conta com uma produção média anual de 16 toneladas da castanha e poderá servir de piloto para os outros locais.

A estimativa de renda bruta da produção nas áreas de coleta é de R$ 64.000,00, de acordo com a justificativa socioeconômica do plano. Os valores retidos pelos custos de coleta, taxas da associação, contrapartida da área do proprietário e despesas operacionais somam aproximadamente 20%.

Benedita afirma que as conquistas e a visibilidade da castanha-do-Brasil dentro e fora do município de Cotriguaçu conquistada ao longo dos últimos anos garantem à associação um “futuro com as melhores perspectivas possíveis.”

Crédito:
Assessoria de Informação
ICV Instituto Centro de Vida

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