Água e Mudança Climática estão inextricavelmente ligadas, segundo UNWater

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Por Dr. Ricardo Camilo Galavoti, Doutor em Ciências com concentração em Engenharia Hidráulica e Saneamento (EESC / USP) e colaborador da nossa plataforma AMBIENTAL MERCANTIL NOTÍCIAS.

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Com 2,2 bilhões de pessoas vivendo sem acesso a água potável, o Dia Mundial da Água, estabelecido pelas Nações Unidas para ser comemorado em todo dia 22 de março de cada ano, amplia nossa consciência acerca dos desafios globais para o tema da água, e motiva as organizações e indivíduos a ações de enfrentamento da crise mundial da água. Um dos focos centrais deste dia é o de fornecer suporte para o cumprimento do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 6: Água e Saneamento para Todos até 2030.

O tema do Dia Mundial da Água 2020 é: “Água e Mudança Climática”. As mensagens chave da campanha deste Dia Mundial da Água 2020 estão focadas na necessidade, para os criadores de políticas públicas voltadas para o clima, de colocarem a água no coração de seus planos de ação, em como a água pode auxiliar na luta contra as mudanças climáticas, através da adoção de tecnologias e soluções voltadas à água e ao saneamento que sejam sustentáveis, disponíveis e escaláveis, e voltadas ao papel que todos nós temos de enfrentar as mudanças climáticas em nossas vidas diárias.

É assim que é definido, em seu contexto, este Dia Mundial da Água 2020, pela International Association for Hydro Environmental Engineering and Research – IAHR, parceira da UN-WATER, celebrado a partir de nossos “home-offices”, em meio a esta crise mundial causada pelo fenômeno COVID-19 – Coronavírus, buscando subsídios para o debate acerca das conexões entre água e mudanças climáticas.

A campanha deste Dia Mundial da Água 2020 apresenta declarações como:

– Não podemos nos permitir esperar. Os criadores de políticas públicas voltadas para o clima têm de colocar a água no coração de seus planos de ação;

– A adaptação da água aos efeitos das mudanças climáticas pode proteger a saúde e salvar vidas;

– A água pode ajudar na luta contra as mudanças climáticas. Existem tecnologias e soluções sustentáveis, disponíveis e escaláveis voltadas à água e ao saneamento. O uso da água de modo mais eficiente pode reduzir os gases de efeito estufa (GEE);

– Todos têm um papel para cumprir. Em nossas vidas diárias, surpreendentemente, existem medidas fáceis que todos podemos adotar na abordagem às mudanças climáticas. A água é nosso mais precioso recurso;

– precisamos usá-lo de maneira mais responsável. Temos de encontrar o equilíbrio entre todas as demandas hídricas da sociedade, enquanto asseguramos que as populações mais pobres não sejam deixadas para trás.

A UN-WATER afirma que, à medida que a população mundial aumenta, eleva-se a demanda de água, demanda essa que tende a exaurir os recursos naturais e causar danos ambientais em diversos locais. Soluções para tanto incluem medidas de proteção para sumidouros de carbono como os oceanos, e wetlands, bem como a adoção de técnicas de agricultura inteligente para o clima, e o incremento ao reúso seguro de águas de esgotamento sanitário, ou águas residuárias em geral.

As reservas hídricas estão sob constante pressão, na medida em que a população global cresce e os recursos naturais são exauridos; as mudanças climáticas servem apenas para exacerbar esta situação. Diante deste quadro, vamos abordar uma das alternativas apontadas pela UN-Water como solução para a problemática água/mudanças climáticas: o reúso seguro de águas de esgotamento sanitário, ou águas residuárias em geral, ou seja, águas previamente tratadas e destinadas para reúso seguro.

Saneamento sustentável e descentralizado: Reúso seguro com recuperação de recursos – água, energia e nutrientes

Os conceitos de saneamento descentralizado e sustentável têm seu foco no tratamento e reciclagem de recursos presentes nos esgotos domésticos.

Há três recursos principais:

A bioenergia gerada pela transformação de material orgânico;

Nutrientes vegetais (nitrogênio e fósforo como nutrientes principais, mas também potássio e enxofre);

E água (produzida após tratamento avançado de volumes de águas residuárias mais limpas). O tratamento de volumes de águas residuárias é realizado de modo a que seu potencial de reúso seja preservado.

Em 10 de setembro de 2019, no 34º Simpósio Anual WateReuse em San Diego (EUA), a Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos EUA anunciou um projeto de Plano Nacional de Ação de Reutilização de Água para consulta pública, contendo 46 ações propostas, a serem realizadas por instituições federais, estaduais, partes interessadas privadas, a fim de promover 10 objetivos estratégicos.

Para muitos no setor de água, esse foi um reconhecimento bem-vindo, até mesmo uma validação de um novo movimento e conjunto de práticas e tecnologias que terão impacto sobre a água potável, energia, agricultura e a indústria em todos os lugares onde for adotado. Tudo isso contribui para o chamado reúso de água, a descoberta de “água encontrada” nos efluentes de uma comunidade, convertida em recurso valioso.

Coletivamente, essas novas abordagens desconstroem a própria ideia de “efluentes”. Isso (pode) representar uma mudança, existindo (então) somente “água desperdiçada”.

Uma cartilha publicada pela American Water Works Association (AWWA) em 2016 fornece algumas definições úteis: O reúso não potável refere-se à água que não é usada para beber, mas é segura para fins como irrigação, incluindo campos de golfe e gramados, ou processos industriais. Reúso potável “refere-se à água reciclada ou recuperada que é segura para beber.” O reúso potável indireto introduz água purificada em uma zona de amortecimento ambiental (buffer), como aquífero, reservatório ou lago, antes que a água misturada seja introduzida em um sistema de abastecimento de água.

Finalmente, o reúso potável direto “introduz a água purificada diretamente em um sistema de abastecimento de água existente”. Essa é a fronteira final do reúso da água e está apenas começando a ser contemplada nos Estados Unidos.

O reúso de água é local, sustentável e econômico, porque os efluentes estão disponíveis mesmo durante condições de seca e causam menos danos ao meio ambiente do que outras soluções de abastecimento de água, como barragens, reservatórios e canais.

Segundo a Bluefield Research, a capacidade atual de reúso nos Estados Unidos deve aumentar em 37% até 2027. As aplicações industriais crescerão 31% no mesmo ano. Os EUA já são o maior mercado de reutilização em volume, com um crescimento futuro projetado além desses dados.

”O reúso de água envolve o uso de água mais de uma vez, para expandir o abastecimento de água disponível de uma comunidade.” É muito mais econômico do que encontrar novas fontes, segundo Bluefield Research.

Recuperação de recursos: Água, energia e nutrientes

Ainda pensando em termos de benefícios gerados pelo reúso, Dupont Water Solutions traz o seguinte posicionamento: “Nós já sabemos como resolver nossos problemas com a água – agora vamos fazer acontecer”. E então faz a seguinte pergunta: “As águas residuárias são uma fonte de valiosos (recursos): água, energia e nutrientes: Como recuperar isso?”.

De acordo com Dupont Water Solutions, um estudo recente, apresentado em janeiro/2020, do Instituto para a Água, Meio Ambiente e Saúde da Universidade das Nações Unidas, mostrou que grandes quantidades de água, nutrientes e energia estão sendo lançados fora, por assim dizer, nos fluxos de águas residuárias do mundo. O estudo afirma que: “Há um interesse proativo na recuperação de água, nutrientes e energia, advindos de fluxos de águas residuárias, com o aumento de volumes de águas residuárias municipais e das inovações na recuperação de recursos.”

Globalmente, produzimos quantidades de águas residuárias equivalentes a cerca de cinco vezes o que passa por Niágara Falls durante um ano. Contida em toda esta água residuária, há energia suficiente para alimentar todas as residências nos EUA e México, nutrientes suficientes para atender 13% das necessidades globais de fertilizantes, e água suficiente para encher o Lago Ontário por quatro anos, de acordo com o estudo.

Mudança de comportamento e paradigmas na nova Relação Água/ Mudanças Climáticas

“Vivemos agora em uma nova era, na qual o comportamento humano está moldando o mundo e causando nossos principais problemas, como a crise climática. Se quisermos mudar isso, temos de mudar o comportamento humano”, nas palavras de Lucía Aguirre Sanchez, pesquisadora e estrategista na organização internacional sem fins lucrativos Center for Behavior & the Environment, RARE (Waterfront, Janeiro de 2020).

O tema do reúso de água constitui algo bastante atual, mas o que se evidencia é uma mudança de paradigmas acerca do uso de recursos naturais como a água, uma vez que, sob pressão da demanda crescente, alia-se hoje um novo fator de estresse hídrico global: as mudanças climáticas, apontadas neste Dia Mundial da Água 2020.

Segundo o especialista Roberto Ranzi (IAHR), o impacto das mudanças climáticas sobre o ciclo hidrológico é evidente, embora ocorram variabilidades regionais elevadas. Ainda, é preciso discriminar entre fatores naturais e antrópicos, e isso é crucial. Por fim, a engenharia voltada aos recursos hídricos e às suas disciplinas científicas, pode auxiliar, sugerindo soluções e alternativas estruturais e não estruturais para a adaptação aos desafios das mudanças climáticas, para a presente geração, assim como para as futuras. Trata-se de uma mudança comportamental, uma nova visão frente aos problemas e desafios que estas novas circunstâncias nos apresentam, dia a dia. Não se pode descartar, inclusive, que a crise global causada pelo surgimento do COVID-19 tenha sido influenciada pelas mudanças climáticas que enfrentamos.

Resta-nos, por tudo o que foi visto anteriormente, agir dentro de nossa esfera de influência, revendo nossos conceitos e prioridades acerca da água, e em face das onipresentes mudanças climáticas, que têm afetado todos os aspectos da existência humana, adquirirmos uma nova consciência: não há tempo algum a perder, para nós, enquanto humanidade, e para o planeta que nos abriga.

SOBRE NOSSO ESPECIALISTA E COLABORADOR

Dr. Ricardo Camilo Galavoti, 
Tecnólogo em Saneamento (FT/Unicamp), Mestre em Engenharia Civil e Doutor em Ciências com concentração em Engenharia Hidráulica e Saneamento (EESC / USP). Autor do livro: 
USO E GESTÃO EFICIENTE DA ÁGUA EM EDIFICAÇÕES: APROVEITAMENTO PLUVIAL E REUSO DE ÁGUAS RESIDUAIS -PESQUISAS E SUAS APLICAÇÕES
REFERÊNCIAS 
https://www.iahr.org/index/detail/90 
https://www.unwater.org/world-water-day-2020-water-and-climate-change/ 
https://www.tratamentodeagua.com.br/agencia-protecao-ambiental-euaefluentes/?utm_source=Newsletter&utm_medium=RD_Dezembro04&utm_campai gn=RD_Dezembro04&utm_term=Efluentes&utm_content=Efluentes https://www.triplepundit.com/story/2020/wastewater-recovery-water-energynutrients/86696/ 
https://www.siwi.org/publications/stockholm-waterfront-no-1-2020/ 

- GALAVOTI, R. C. (2011). PROPOSTA DE UM MODELO DE GESTÃO INTEGRADA DE ÁGUAS URBANAS EM ESCALA DE LOTE RESIDENCIAL: ALCANCES E LIMITAÇÕES. Ricardo Camilo Galavoti. Orientador: Eduardo Mario Mendiondo. Universidade de São Paulo (USP). São Carlos, 2011. 

- KUJAWA-ROELEVELD, K. & ZEEMAN, G. (2006). Anaerobic Treatment in Decentralised and Source-Separation-Based Sanitation Concepts. Reviews in Environmental Science and Bio/Technology (2006), 5:115-139.  

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