COP28: Saída dos combustíveis fósseis é acordada, mas sucesso dependerá de ações para estruturar a transição

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Imagem: Divulgação | Participaram das discussões na COP28 em Dubai, André Luis Ferreira, David Tsai, Isis Nóbile Diniz e Ricardo Baitelo, do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) – Texto final da Conferência avança ao mirar os combustíveis fósseis; próximo passo é reduzir sua dependência

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Dezembro de 2023 – Pela primeira vez, o texto acordado entre os mais de 190 países que participaram da 28ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU) em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, reconheceu a necessidade de estabelecer uma transição justa, ordenada e equitativa dos combustíveis fósseis para as energias renováveis, de modo a evitar o aquecimento do planeta acima do 1,5 ºC. Por outro lado, o texto incluiu pontos que deverão  postergar o uso de combustíveis fósseis, como o reconhecimento genérico da importância de fontes de transição, dando amplo espaço para a utilização do gás fóssil. O documento recomenda também a promoção de tecnologias de captura e sequestro de carbono, que manteriam a licença para a operação de termelétricas a combustíveis fósseis. 

A discussão sobre descontinuar os combustíveis fósseis (“phase out”, conforme a proposta rechaçada na Conferência de 2021 em Glasgow e posta à mesa em Dubai) foi substituída no atual texto por transicionar (“transition away”). Há que se celebrar um avanço em relação à frustração da COP26, que teve consenso apenas na redução gradual de combustíveis fósseis (“phase down”). Também há mérito em incluir os objetivos traçados pela Agência Internacional de Energia de triplicar a instalação de energias renováveis e dobrar a eficiência energética, ainda que os valores numéricos pretendidos tenham ficado de fora.

Dependendo de tais valores, o alinhamento em direção ao crescimento de renováveis e medidas de eficiência energética poderão exercer efeito sobre a redução da demanda por combustíveis fósseis, notadamente carvão. Mas conter a exploração de petróleo envolve necessariamente o desafio de quebrar a dependência dos sistemas de transportes pelos combustíveis, em especial o óleo diesel e a gasolina, além de medidas orientadas para sua racionalização através do planejamento urbano e logístico. Adicionalmente, as alternativas renováveis precisam ganhar escala de modo a se tornar opções econômicas para a sociedade. 

É claro que a inflexão das emissões globais somente acontecerá com a implementação de ações para reduzir o consumo de combustíveis fósseis. Estas são anunciadas nas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), metas nacionais de mitigação de emissões que cada país deve apresentar. No jogo atual, a lição de casa de cada país é livre e autodeterminada, ficando de fora da equação a contribuição histórica de cada país. Aliás, o financiamento para que os países em desenvolvimento possam realizar sua transição energética (incluindo as condições de abrir mão da exploração de petróleo) não obteve consenso e será o tema central da próxima COP29, a ser realizada no Azerbaijão. 

Quanto ao Brasil, é preciso celebrar tanto o compromisso reassumido de desmatamento zero pelo atual Governo Lula, como o crescimento doméstico da geração de energia elétrica a partir de fontes renováveis. No entanto, a intenção brasileira de se apresentar como líder climático foi efetivamente frustrada dado o interesse manifestado de entrar equivocadamente no clube dos maiores produtores mundiais de petróleo – a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) – e a realização do leilão de blocos de petróleo pela Agência Nacional de Petróleo (ANP), horas depois do encerramento da Conferência.

Além da oferta de blocos em áreas socio-ambientalmente sensíveis, cabe questionar a força motriz do problema: para que e por quem será usado esse petróleo que o governo brasileiro pretende continuar produzindo?

Importante salientar que a metodologia do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) atribui as emissões da queima de combustíveis aos consumidores e não aos produtores. A discussão posta sobre “transitioning away” ressalta a disparidade entre os níveis de consumo entre os países e também dentro deles, como o contraste entre os Estados Unidos e o Brasil.

O texto final da COP não aponta que os países desenvolvidos devem ser os primeiros em implementar o processo de transição.

Mais do que isso, o processo de transição deve dar conta de endereçar as disparidades de consumo mesmo dentro do Brasil. A Amazônia, palco da COP30, é um dos maiores exemplos de regiões destinadas à exploração de recursos naturais para exportação, ao mesmo tempo em que a população residente tem baixa renda e condições precárias de acesso a infraestruturas fundamentais, como saneamento básico e energia.

Na Amazônia Legal, cerca de um milhão de pessoas ainda vive sem acesso a energia elétrica. 

A transição justa, ordenada e equitativa, discutida em eventos e consolidada no texto final do encontro, deve recolocar a desigualdade do consumo energético no centro da discussão climática. O caminho para a COP30 envolve tanto a estruturação de políticas domésticas bottom-up, equacionando o acesso a energia e a processos inclusivos para o planejamento energético local, quanto top-down, com ações concretas para a redução da demanda de combustíveis fósseis para indústria, transportes e geração de eletricidade, especialmente nos países de maior consumo.

O tempo é curto para implementar essas ações, mas o prazo para conter as mudanças climáticas é agora.

Sobre o IEMA | Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA)

O Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) é uma organização sem fins lucrativos brasileira, fundada em 2006 e com sede em São Paulo (SP). Ele tem contribuído para a melhoria da qualidade ambiental de forma socialmente justa e sustentável por meio da geração e da sistematização de conhecimento técnico e científico, subsidiando a formulação e a avaliação de políticas públicas nas áreas de energia elétrica e de transportes.

Propósitos: qualificar os processos decisórios para que os sistemas de transporte e de energia no Brasil assegurem o uso sustentável de recursos naturais com desenvolvimento social e econômico.

Site oficial: https://energiaeambiente.org.br

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