Pesquisa revela que besouros podem transformar cupinzeiros do Cerrado em abrigos para várias espécies

Besouros do gênero Actinobolus provocam mudanças na estrutura interna de cupinzeiros do Cerrado. | Foto: Luis Felipe Carvalho de Lima
Besouros do gênero Actinobolus provocam mudanças na estrutura interna de cupinzeiros do Cerrado. | Foto: Luis Felipe Carvalho de Lima

Imagem: Divulgação

  • Larvas do besouro do gênero Actinobolus podem deixar cupinzeiros ocos, gerando abrigo para diferentes espécies de animais, como cobras, roedores e aves;
  • O estudo realizado na Reserva Natural Serra do Tombador, no interior de Goiás, foi publicado na revista científica internacional Austral Ecology.

Julho de 2025 – Um estudo conduzido por pesquisadores brasileiros na Reserva Natural Serra do Tombador, no interior de Goiás, revela que a interação entre besouros do gênero Actinobolus e os cupinzeiros – estruturas semelhantes a pequenos montes de terra onde vivem os cupins, comuns na paisagem do Cerrado – é capaz de gerar abrigo para diferentes espécies da fauna em situações adversas, como incêndios florestais.

Os cientistas descobriram que o besouro, ao depositar suas larvas no interior dos cupinzeiros, pode destruir colônias de cupins e modificar a “arquitetura” interna dessas construções naturais, facilitando o acesso de outros insetos, além de cobras, roedores e aves.

“Os cupinzeiros são conhecidos como ‘engenheiros de habitat’ por sua importância ecológica no Cerrado, transformando-se em abrigos para muitas espécies, especialmente durante incêndios florestais e períodos de seca”, afirma o biólogo Reuber Brandão, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor de Manejo de Fauna e de Áreas Silvestres da Universidade de Brasília (UnB), que coordenou o estudo.

A descoberta foi publicada em artigo na revista científica internacional Austral Ecology, assinado por Brandão, tendo como primeiro autor o jovem pesquisador Luís Felipe Carvalho de Lima, seu orientando na UnB. O estudo mostrou, no entanto, que essa infestação ainda é rara, ocorrendo em apenas 2% dos cupinzeiros examinados. “Localizamos apenas 4 entre 179 cupinzeiros analisados, mas o impacto observado é bem significativo, pois a destruição do ninho pelos besouros facilita o acesso de animais de maior porte, que passam a usar as estruturas como abrigo”, explica Brandão.

Estrutura resistente do cupinzeiro abriga diferentes espécies durante incêndios florestais no CerradoFoto: Reuber Brandão.

O cupinzeiro tem uma camada de terra externa muito resistente. Internamente, entretanto, onde fica o ninho dos cupins, o abrigo é mais maleável, feito de terra, fezes, saliva e matéria vegetal digerida. As estruturas oferecem não apenas abrigo contra ameaças externas, como ajudam na proteção térmica e na manutenção do microclima.

O professor da UnB observa que ainda há muito a ser descoberto sobre o comportamento e o ciclo de vida do besouro do gênero Actinobolus. “A interação entre esses insetos e os cupinzeiros pode ser um fator importante na gestão de áreas sujeitas a incêndios florestais, que infelizmente tendem a se tornar mais frequentes com as mudanças climáticas”, alerta Brandão. Ele acrescenta que o estudo continuará a acompanhar o comportamento desses besouros e os efeitos de suas atividades nos ecossistemas do Cerrado.

Para Mariana Vasquez, gerente da Reserva Natural Serra do Tombador, unidade de conservação criada e mantida pela Fundação Grupo Boticário desde 2007, a descoberta demonstra a importância de pesquisas científicas para entender melhor a ecologia no Cerrado, especialmente para a gestão de unidades de conservação. “Quanto mais conhecimento tivermos sobre as diversas espécies da fauna, da flora e seus processos ecológicos, mais ferramentas teremos para contribuir com a conservação do Cerrado, que tem uma biodiversidade tão rica quanto ameaçada”, frisa a gerente.

Cupinzeiros mais vulneráveis

Apesar do benefício para outras espécies, essa transformação gera consequências negativas a longo prazo na estrutura dos próprios cupinzeiros, que se tornam mais vulneráveis à erosão por chuva e ao desgaste provocado pelo fogo. O pesquisador explica que, embora o número de cupinzeiros afetados pelo besouro do gênero Actinobolus seja baixo, o monitoramento a longo prazo é essencial.

Além de contribuir para a conservação da biodiversidade, Brandão sugere que a observação das interações entre as espécies na natureza pode inspirar soluções para a sociedade. “Imagine um prédio construído com a lógica dos cupinzeiros, capaz de resistir a condições climáticas adversas e criar um abrigo microclimático de forma natural. Muitas soluções para melhorar nossa qualidade de vida estão na observação da natureza”, conclui o pesquisador.

A Reserva Natural Serra do Tombador

A Reserva Natural Serra do Tombador é uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) que protege 8.730 hectares de Cerrado, localizada em Cavalcante (GO). Classificada pelo Ministério do Meio Ambiente como área de extrema prioridade para a conservação da biodiversidade do Cerrado, é a maior RPPN do estado de Goiás. A unidade, que não é aberta à visitação pública, recebe pesquisadores dedicados ao estudo da conservação da biodiversidade, da ecologia do fogo e do Manejo Integrado do Fogo (MIF). Já foram registradas 437 espécies de plantas e 531 espécies de animais na reserva, algumas delas ameaçadas de extinção. A reserva também é considerada uma Solução Baseada na Natureza (SBN), contribuindo para a proteção de recursos hídricos, a regulação do clima e a fixação de carbono no solo.

Sobre a Rede de Especialistas em Conservação da Natureza

A Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) reúne cerca de 80 profissionais de todas as regiões do Brasil e alguns do exterior que trazem ao trabalho que desenvolvem a importância da conservação da natureza e da proteção da biodiversidade. São juristas, urbanistas, biólogos, engenheiros, ambientalistas, cientistas, professores universitários – de referência nacional e internacional – que se voluntariaram para serem porta-vozes da natureza, dando entrevistas, trazendo novas perspectivas, gerando conteúdo e enriquecendo informações de reportagens das mais diversas editorias. Criada em 2014, a Rede é uma iniciativa da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza. Os pronunciamentos e artigos dos membros da Rede refletem exclusivamente a opinião dos respectivos autores. Acesse o Guia de Fontes em https://fundacaogrupoboticario.org.br

Sobre a Fundação Grupo Boticário

Com 35 anos de história, a Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza é uma das principais fundações empresariais do Brasil que atuam para conservar o patrimônio natural brasileiro. Com foco na adaptação da sociedade às mudanças climáticas, especialmente em relação à segurança hídrica e à proteção costeira, a instituição atua para que a conservação da biodiversidade seja priorizada em todos os setores. Alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, considera que a natureza é a base para o desenvolvimento social e econômico do país. Sem fins lucrativos e mantida pelo Grupo Boticário, a Fundação Grupo Boticário contribui para que diferentes atores estejam mobilizados em busca de soluções para os principais desafios ambientais, sociais e econômicos. Já apoiou mais de 1.800 iniciativas em todos os biomas no país. Protege duas reservas naturais de Mata Atlântica e Cerrado – os biomas mais ameaçados do Brasil pelo desmatamento –, somando 11 mil hectares, o equivalente a 70 Parques do Ibirapuera. Com 1,4 milhão de seguidores nas redes sociais, busca também aproximar a natureza do cotidiano das pessoas. A instituição é fruto da inspiração de Miguel Krigsner, fundador e presidente do Conselho do Grupo Boticário, criada em 1990, dois anos antes da Rio-92 ou Cúpula da Terra, evento que foi um marco para a conservação ambiental mundial.

Site Oficial: https://fundacaogrupoboticario.org.br

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