Um mergulho sem refresco

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Imagem: Divulgação | Uma Gota no Oceano

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Não se iluda com a água gelada da próxima vez que for à praia. Organizado por 20 cientistas de 13 instituições, um estudo divulgado este mês na publicação científica Advances in Atmospheric Sciences apontou que, em 2020, os oceanos registraram as temperaturas mais altas desde 1955. Sabe-se que os mares estão esquentando há, pelo menos, 70 anos. Acontece que o processo acelera como um tsunami que se aproxima da costa.

Entre 1986 e 2020, o aumento médio do calor acumulado nos mares foi 8 vezes maior que o verificado entre 1958 e 1985.

E ganha uma estrela-do-mar dourada quem acertar qual dos cinco foi o oceano que mais esquentou no período. Sim, ele mesmo, o seu, o meu, o nosso Atlântico. Será que não é hora de darmos uma atenção maior a isso?

Oceanos não esquentam do nada. No caso em questão, pesquisadores como Lijing Cheng, da Academia Chinesa de Ciências, apontam o efeito estufa como origem do problema.

“Mais de 90% do excesso de calor gerado pelo aquecimento global é absorvido pelos oceanos“, afirma ele.

Há outros números de tirar o fôlego. Entre 1995 e 2020, nossos mares incorporaram uma quantidade de calor equivalente à explosão de 3,6 bilhões de bombas de Hiroshima. É muita energia para um período relativamente pequeno.

Como os oceanos têm ligação direta com o clima, as consequências começam a aparecer. No ano passado, o Atlântico registrou 29 tempestades, um recorde inédito. A umidade que alimentou furacões no Caribe e no sul dos Estados Unidos foi a mesma que fez falta na Amazônia e se traduziu em uma temporada de incêndios na floresta, segundo a Nasa. Ou seja, o aquecimento das águas já está bagunçando nosso regime climático. Só não vê quem não quer.

Como no começo do filme Tubarão, muita gente já começa a olhar preocupada para a confusão logo ali além da areia. A diferença é que, na vida real, ainda há o que ser feito. Um exemplo é a ONU, que vai celebrar entre 2021 e 2030 a Década Internacional do Oceano. Assim mesmo, no singular, para promover a ideia de que todos os mares são, na verdade, um só e devem ser preservados. Afinal, eles nos prestam bons serviços.

Você sabia que o habitat de algas, sardinhas e golfinhos absorveu 7 gigatoneladas de carbono só em 2019? O dado é do Global Carbon Project. Se todo este volume tivesse sido lançado na atmosfera, nosso planeta teria ficado muito mais quente. Por outro lado, este porre de CO2 está deixando o mar de ressaca. Nos últimos 2 séculos, a acidez das águas subiu cerca de 30%, o que afetou animais marinhos sensíveis a esta variação. Não é exatamente o tipo de problema que se resolve só com um antiácido.

Os impactos das mudanças do clima nos oceanos não param por aí. Com o calor, o gelo dos polos derrete e o aumento do nível do mar é outro fenômeno que tira o sono de muitos. As medições indicam uma subida média de 24 centímetros entre 1850 e 2010. Já para os próximos 79 anos, são esperados acréscimos entre 48 e 56 centímetros, segundo a WWF. Na primeira hipótese, 46 milhões de pessoas seriam afetadas; Na segunda, 49 milhões. Com 50 milhões de habitantes distribuídos por 9 mil quilômetros de litoral, o Brasil deveria estar mais atento a isso, não é? Não podemos deixar que a continental costa brasileira e toda sua biodiversidade deixem de ser um dos nossos maiores patrimônios e se tornem um problema.

Este calor todo também terá impacto nos animais. Se nada for feito, a tendência é que 90% dos corais do planeta estejam mortos até 2050, por exemplo.

Mais quentes, os oceanos retêm menos oxigênio. A taxa de gás dissolvido na água já caiu 2% entre 1960 e 2010. Se nada mudar, pode cair 4% até o fim deste século. Se você gosta de iguarias como um bom atum, a boa é já começar a se despedir, porque neste cenário elas desapareceriam do mapa. Quer dizer, da água.

Como o protagonista do clássico O Velho e o Mar, não devemos nos desesperar na busca por nossos objetivos. Se o ser humano conseguiu desenvolver uma vacina eficaz contra um vírus letal em menos de 1 ano, ele é capaz de usar sua inteligência para reverter os riscos iminentes à vida marinha. De acordo com especialistas, o mais urgente é reduzir as emissões de CO2 para derrubar o volume de calor armazenado pelo mar. Não foi à toa que a volta dos Estados Unidos ao Acordo de Paris foi anunciada por Joe Biden, o novo presidente americano, assim que assumiu seu posto na Casa Branca. Cuidar do assunto é algo, literalmente, para ontem. Se o Brasil quiser fazer sua parte, vai precisar mudar de atitude, já que as metas para 2030 anunciadas em dezembro soaram, no mínimo, acanhadas.

Outro esforço necessário é a criação de unidades de conservação marinha. É uma caminhada longa, na qual o país ainda está em seus primeiros passos. Em 2018, aumentamos de 1,5% para 26,4% a fatia de áreas protegidas na nossa Zona Econômica Exclusiva. Mas ainda há muito por fazer. Para além disso, é preciso prestigiar o papel desempenhado por pescadores e outras populações tradicionais na preservação do litoral – assim como as pesquisas de ponta desenvolvidas pelo Observatório do Clima. Composta por mais de 50 organizações (inclusive Uma Gota no Oceano), a rede criou um grupo para estudar a relação entre o mar e o clima, de onde bebemos muitos dos dados aqui apresentados.

Como diz a canção, quem é do mar não enjoa. Cada um é responsável por arregaçar as mangas e construir um futuro diferente.

Site oficial: https://umagotanooceano.org/

Crédito:
Imprensa | Uma Gota no Oceano

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