Imagem: Daniel Beltra/Greenpeace – Incêndio florestal
Por Adson Dutra, Colaboração para Ambiental Mercantil, em São Paulo
Segundo uma pesquisa realizada pela Mapbiomas, do ano de 2000 a 2019, o cerrado foi o bioma brasileiro mais destruído com incidências de fogo em 41% de sua área. E dos 76% do que se queimou era vegetação nativa.
O incêndio florestal é um cenário preocupante, uma vez que o desmatamento provoca danos irreversíveis a natureza, como pontua a doutora em ciências biológicas, professora pelo Senac (SP), Betina Alves.
As raízes das árvores do bioma são profundas e em conjunto com as raízes dos arbustos e gramíneas, formam uma enorme rede de canais que reservam água, mesmo nas estações mais secas.
Ainda de acordo com a especialista, a rede subterrânea é responsável por irrigar o Pantanal e partes da Amazônia. E com o desmatamento da savana, as águas subterrâneas estão sofrendo uma severa redução, porque sem as raízes, a água não atinge os lençóis freáticos.
“O avanço da agropecuária e da silvicultura tem sido grandes responsáveis pelo desmatamento do cerrado. Metade da vegetação super diversa da região foi dizimada. Boa parte da produção de soja do Brasil está nessa floresta”, informa.
Em um outro levantamento divulgado pela Mapbiomas intitulado, “Vegetação nativa perde espaço para a agropecuária nas últimas três décadas”, o cerrado aparece com a vegetação mais ocupada pela agropecuária na mata atlântica, com 45% de posse.
A partir dos dados apresentados, é notório que a floresta vem sendo desmatada constantemente. A vegetação abriga famílias, povos tradicionais e animais que vivem e dependem dela. Conforme a organização, Rede Cerrado, são mais de 80 etnias indígenas, quilombolas e ribeirinhos que vivem do extrativismo, artesanato e agricultura familiar no bioma.
Consequências
Alves comenta que há dois tipos de queimadas, os naturais e as antrópicas. As queimadas que ocorrem de forma natural são raríssimas, e com isso as espécies conseguem se recuperar naturalmente, muitas germinam e soltam flores. Mas as queimadas antrópicas, resultantes da ação humana, prejudicam as de origem natural, como consequência as espécies não conseguem se recuperar, por conseguinte a floresta é devastada.
“As queimadas naturais não são o problema, mas sim o aumento brutal na ocorrência de queimadas de ação humana na região de cerrado brasileiro nos últimos anos,” justifica a bióloga.
O papel de movimentos ambientais que buscam fazer a diferença
A percepção dos fatos não é só evidenciada na área técnica que fundamenta os conceitos apresentados pelas pesquisas realizadas. Temos diversos casos vividos na prática, conforme a realidade do agricultor e liderança de movimento social em prol do cerrado e luta pela terra, Adilson Machado.
O ativista foi uma liderança da Comissão Pastoral da Terra e representa uma importante figura do movimento até os dias de hoje. Ele vive desde criança em áreas de assentamento quando sua família se mudou do Paraná para o estado de Rondônia. E assegura que o cenário da região é conturbado e que sente essas mudanças no dia a dia.
“O agronegócio está desmatando, acabando, destruindo, abrindo valas, drenando as margens do rio Guaporé na fronteira com a Bolívia, nos municípios de Pimenteiras, Cabixi, Cerejeiras, Corumbiara em regiões de cerrado de áreas de reservas, preservação permanentes estão sendo drenadas para a expansão de soja. Sendo essa umas das grandes dificuldades da liderança a frente do movimento,” enfatiza o agricultor.
Machado testemunha diversos acontecimentos que faz o trabalho do pequeno agricultor e lideranças à frente de projetos sociais como o dele, serem penosos e árduos, uma vez que o desmatamento só cresce com as constantes queimadas.
“A situação é complicada, há o conflito de terras alarmante, despejo em plena pandemia, mortes e chacinas. É dificultoso ser agricultor nessa região e ter que conviver com agrotóxicos, contaminação das águas, doenças e perseguição,” conta sua experiência vivendo no território.
Jornalista e também ativista do movimento “Comissão Pastoral da Terra”, Leuziene Lopes, acredita numa causa que inclui a participação de todos, igualmente voluntária e involuntária.
Segundo ela, a organização faz um trabalho de ‘acompanhamento’ com objetivo central de lutar pela terra com base em tudo que a gira em torno. É trabalhado a formação de lideranças, a preservação das nascentes e dos povos que ali vivem.
“Eu considero muito importante a participação da juventude nesse processo, independente do contexto em que elas estejam. Como por exemplo, se alguém vive num ambiente urbano de grande centro e pensar que não precisa do trabalho que é feito em Rondônia, ou qualquer lugar no interior do Brasil, é um pensamento retrógado e ignorante,” diz.
Lopes garante que essa questão vem do ponto de vista do ambiente ao qual todos estamos ligados, não importa o espaço social. O que o pequeno agricultor produz no campo é colocado na boca do morador da grande cidade.
“O fato de a juventude ajudar a preservar o cerrado vai afetar diretamente na vida dos jovens que estão no contexto urbano dos grandes centros. Muitos efeitos climáticos que temos sentindo será as metrópoles e quem está na base da agricultura que vão sofrer essas consequências com maior intensidade,” pontua a ativista do movimento.
O papel da imprensa
E por fim o papel da imprensa em meio a toda essa problemática é altamente indispensável para mostrar a veracidade dos fatos e cobrar medidas de prevenção. O impacto midiático do quarto poder influencia a sociedade civil.
“A comunicação e o jornalismo têm um papel fundamental de educação e denúncia. É educar as pessoas em preservar a natureza, independente da circunstância a que estão. Há uma deficiência em relação a isso. Se conversamos com alguém sobre o cerrado, muito provável que não vão saber o que é o bioma, e do que se trata do berço das águas,” ressalta a jornalista.
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Imprensa | Ambiental Mercantil