OPINIÃO DE ESPECIALISTA: Como desenvolver uma estratégia integrada de gestão de cheias às bacias hidrográficas no Rio Grande do Sul

softelec

As bacias Hidrográficas

Imagem: site do Governo do estado do Rio Grande do Sul,
Secretaria do Meio ambiente e Infraestrutura

A dinâmica econômica e social ocorre nas cidades, mas a dinâmica da água ocorre na bacia hidrográfica. Planos Diretores de Drenagem Urbana (PDDU) e planos integrados de gestão de risco de inundações precisam ser pensados no contexto das bacias maiores (não apenas bacias urbanas) para evitarmos que áreas fiquem desprotegidas e aproveitarmos oportunidades de sinergias, economicidade em projetos integrados, compartilhamento de custos e operação mais eficiente. Exemplos incluem desde obras de maior porte (reservatórios e diques) quanto políticas de conservação de solo e água que aumentem a infiltração ou contribuam para o amortecimento de cheias via preservação de várzeas e outras áreas em planícies de inundação. A seguir são apresentados alguns exemplos de instrumentos de planejamento no contexto da bacia hidrográfica.

Planos de Recursos Hídricos das Bacias Hidrográficas
(Planos de bacia)

Publicidade
Publicidade
AMBIENTAL MERCANTIL

A resolução CNRH No. 145/2012 determina que os Planos de Recursos Hídricos das Bacias Hidrográficas devem considerar os demais planos, programas, projetos e estudos existentes relacionados à gestão ambiental, aos setores usuários, ao desenvolvimento regional e uso do solo. Essa mesma resolução especifica ainda que o diagnóstico da situação atual da bacia hidrográfica deve incluir a caracterização da infraestrutura hídrica (o que inclui infraestrutura de proteção contra cheia), enquanto que a etapa de prognóstico deverá propor cenários futuros, compatíveis com o horizonte de planejamento, abrangendo as necessidades e alternativas de prevenção, ou mitigação das situações críticas identificadas. Finalmente, Plano de Bacia deverá conter um Plano de Ações visando a mitigar, minimizar e se antecipar aos problemas relacionados aos recursos hídricos superficiais e subterrâneos, de forma a promover os usos múltiplos e a gestão integrada.

A presença do risco de cheia e inundação em uma bacia se enquadra nesses aspectos.

(4) Normalmente inclui áreas cuja inundação tem menor velocidade, menor poder destrutivo e maior tempo de reação e resposta para evacuação. Áreas de risco geológico, deslizamentos, movimentos de massa, enxurradas e escoamentos de alta velocidade não se aplicam.

A resolução CNRH No. 145/2012 dá ao Plano de Bacia a responsabilidade de realizar prognósticos futuros, com base em cenários de mudança no clima e tendências de desenvolvimento, para a definição de programas e estratégias gerais, na escala da bacia, para redução do risco de cheia, sem adentrar soluções específicas (estas seriam objeto do plano integrado de gestão de risco de inundações). O Plano de Bacia pode também ser usado para o diagnóstico geral das bacias quanto à vulnerabilidade às cheias a partir da análise de manchas de inundação e períodos de retorno.

Plano Diretor de Macrodrenagem da Bacia Hidrográfica do Rio Capivari

Localizado no estado de São Paulo, foi elaborado com o objetivo de reduzir ocorrências de inundações envolvendo 15 municípios. Esse tipo de plano traz soluções integradas de infraestrutura e ações não estruturais, além de dados que poderão auxiliar os municípios em seu planejamento urbano.

Plano de Gerenciamento de Risco (PGR) Na bacia do Paraíba do Sul

Contratado pela secretaria executiva do Comitê de Bacias (Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul – AGEVAP), este plano estruturou informação sobre áreas que podem ser atingidas por diferentes eventos críticos, incluindo probabilidades de ocorrência e classes de intensidade associadas a impactos e elementos atingidos. São incluídas áreas inundáveis conforme probabilidades de ocorrência de cheias, indicação de trechos dos cursos de água com elementos em exposição (usuários) sensíveis a eventos de contaminações devidas a acidentes, empreendimentos expostos a manchas de inundação que possuam material que possa ser carreado em evento crítico e impactar áreas de jusante; identificação de trechos dos cursos de água que podem ser afetados por desastres relacionados a transporte de produtos perigosos; áreas que podem ser afetadas por rompimento de barragens, obtidas a partir dos Planos de Segurança de Barragens (PSB) e respectivos Planos de Ação Emergencial (PAE), mapas com indicação dos pontos de captação para abastecimento público.

Cobrança pelo uso da água

A cobrança é um instrumento econômico que busca induzir a internalização de impactos na bacia. A Lei 9.433/97 e a resolução CNRH No 48 de 2005 definem que a cobrança tem como objetivos estimular o uso racional, promover a preservação e recuperação dos corpos d’água, fomentar a gestão integrada e obter recursos para a administração dos recursos hídricos. Adicionalmente, Marques et al (2024), com a proposta do modelo FAISCA, destacam o potencial da cobrança em contribuir para dar sustentabilidade financeira à gestão da água e viabilizar tanto alguns investimentos na bacia, incluindo o custeio do trabalho técnico-executivo de apoio aos comitês, especialmente quando integrado à elaboração dos planos de bacia.

No Rio Grande do Sul, a percepção da Secretaria de Meio Ambiente aponta a variabilidade dos ingressos financeiros do Fundo Estadual de Recursos Hídricos (FRH/RS), além da natureza extraordinária e limitada de outras fontes de recursos para a gestão (SEMA, 2021). Segundo o órgão, persiste a vulnerabilidade da sustentabilidade financeira do SERH, trazendo a necessidade de se ampliar alternativas e viabilizar outros instrumentos econômicos.

Esse contexto mostra ao mesmo tempo um quadro de fragilidade quanto à sustentabilidade financeira para a gestão de recursos hídricos, que afeta todas as bacias hidrográficas no estado do RS e reflete em sua capacidade de se preparar para as cheias, quanto o potencial da ferramenta cobrança pelo uso da água em contribuir para reduzir essa fragilidade. A longo prazo, a cobrança contribui como alavancador da capacidade gerencial sobre a água, tornando planos de bacia mais exequíveis, aperfeiçoando sistemas de dados e informação, estudos, e sobretudo capacidade técnica para análise e estudo de soluções e diretrizes para planos de gestão de risco de inundações. Quanto melhor essa capacidade, melhores condições o estado terá em produzir soluções estruturantes para o problema das cheias e em articular a implementação dessas soluções de forma duradoura.

Sistema de informações

O sistema de informações sobre recursos hídricos deve organizar um repositório de dados e mapas para a bacia (localização de usuários, topografia em alta resolução, hidrografia, infraestrutura, áreas de risco, dentre outros) para o estabelecimento de uma base de dados comum para o planejamento.

Finalmente, para que as diretrizes e instrumentos sejam implementados e monitorados, é essencial que o Sistema Estadual de Recursos hídricos seja fortalecido, o que inclui melhorias no quadro técnico de pessoal, sistema de monitoramento, alerta e informações, além da capacidade institucional do órgão gestor estadual para articulação com municípios e governo federal, além da criação e fortalecimento dos demais integrantes do SERH, como comitês de bacia e agências.

O direcionamento de recursos federais para a reconstrução do estado após de cheia de 2024 deve considerar, como contrapartida estadual, o fortalecimento do SERH. Caso contrário, corremos o risco de não ter o elemento essencial para a articulação do portfólio de ações ao longo prazo (a governança das águas), e o resultado mais provável é a implementação de um grande número de ações de forma fragmentada sem a construção da resiliência que dará ao estado a tão necessária segurança hídrica contra eventos críticos.

>>>PÁGINA 5>>>
Lacunas urgentes e conclusão

ANUNCIE COM A AMBIENTAL MERCANTIL
AMBIENTAL MERCANTIL | ANUNCIE NO CANAL MAIS AMBIENTAL DO BRASIL
About Ambiental Mercantil Notícias 5671 Articles
AMBIENTAL MERCANTIL é sobre ESG, Sustentabilidade, Economia Circular, Resíduos, Reciclagem, Saneamento, Energias e muito mais!