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- Por Simone Horvatin, jornalista (MTB 0092611/SP) especializada nos setores ambientais e de energias, e associada da BDFJ Bundesverband Deutscher Fachjournalisten e.V. (Federação de Jornalistas Técnicos da Alemanha)
Agosto de 2024 – De acordo com dados da indústria automotiva aproximadamente 95% das partes de um veículo podem ser reutilizadas ou recicladas. De acordo com os resultados da pesquisa do site Business Research Insights o mercado global de reciclagem automotiva foi avaliado em US$ 123,1 bilhões em 2021. Projeta-se que este mercado alcance US$ 2.022,57 bilhões até 2031, apresentando uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 18% durante o período de previsão. O mercado de reposição automotiva, que está relacionado à reciclagem, também mostra um crescimento significativo. Estimou-se que o tamanho do mercado global de reposição automotiva possa crescer US$ 164,58 bilhões entre 2022 e 2027, com uma CAGR de 6,26%.
Frota brasileira e questões ambientais e legais relacionadas ao descarte de veículos
Nos primeiros quatro meses de 2024, as vendas de veículos leves e pesados atingiram 735.000 unidades, um aumento de 16,3% em relação ao mesmo período de 2023. A previsão inicial da Anfavea era um crescimento de 6,1%. A Fenabrave registrou um aumento de 17,5% nas vendas de veículos leves e projetou um crescimento de 12% para o ano, podendo ser revisado para cima. As vendas de híbridos no primeiro quadrimestre de 2024 representaram 30,4 mil unidades (4,4% do mercado), sendo vendas de elétricos 20,8 mil unidades (3% do mercado), carros com motores flex 78,5%, a diesel: 9,8% e a gasolina 4,2%.
De acordo com as informações mais recentes disponíveis nos resultados da pesquisa do Ministério dos Transportes, o Brasil tinha no final de 2023 aproximadamente 47 milhões de veículos em circulação. Este número inclui apenas automóveis e veículos comerciais leves. Quando se consideram também as motocicletas, o total da frota circulante no país chega a 60,4 milhões de veículos. Há um crescimento contínuo da frota brasileira. Em uma década, a idade média dos veículos cresceu mais de dois anos, com um aumento significativo na proporção de veículos mais antigos (entre 11 e 15 anos) em circulação.
O descarte incorreto de veículos representa um risco significativo ao meio ambiente e à saúde humana. Quando abandonados a céu aberto, os veículos podem acumular água, tornando-se focos de proliferação do mosquito Aedes aegypti, transmissor de doenças como dengue, zika e chikungunya. Além disso, fluidos contaminantes como combustíveis, óleos e outros líquidos podem vazar e contaminar o solo e as águas subterrâneas, causando danos ambientais severos. Materiais como metais, plásticos e borrachas, se não forem reciclados, contribuem para a necessidade de extração de novas matérias-primas, incentivando a exploração de recursos e aumentando a pegada ecológica da indústria automotiva.
No que diz respeito à reciclagem de veículos, o Brasil está atrasado em relação a outros países
O Brasil recicla apenas 1,5% da frota de veículos, o que é muito pouco se comparado a países como Argentina, Japão e Estados Unidos, onde o índice de reciclagem automotiva varia de 80% a 95%. Países nórdicos como Dinamarca, Suécia e Noruega atingem 100% de reciclagem. A reciclagem automotiva no Brasil é a mais baixa entre as economias mais desenvolvidas do mundo. Além disso, a reciclagem automotiva poderia gerar empregos e renda, como já ocorre em outros setores de reciclagem no país.
Na Europa, por exemplo, cerca de 85% dos automóveis são reciclados ou têm suas peças reutilizadas. Muitos veículos no Brasil acabam em desmanches ilegais ou são abandonados, causando impactos ambientais.
Para melhorar a reciclagem e reutilização de veículos no Brasil, algumas medidas importantes seriam:
- Criar incentivos fiscais para que a população doe veículos antigos para reciclagem, como descontos em impostos.
- Estabelecer parcerias entre governo e montadoras para desenvolver programas de logística reversa e reciclagem de veículos.
- Regulamentar e fiscalizar os desmanches, combatendo o mercado ilegal de peças.
- Investir em infraestrutura e tecnologia para centros de reciclagem automotiva.
- Promover campanhas educativas sobre a importância da destinação correta de veículos em fim de vida.
- Criar metas progressivas de reciclagem para a indústria automotiva.
- Fomentar o reaproveitamento de peças e materiais na cadeia produtiva.
- Estabelecer pontos de coleta de veículos antigos em parceria com concessionárias.
Essas ações, inspiradas no modelo europeu, poderiam aumentar significativamente as taxas de reciclagem e reutilização de veículos no Brasil, reduzindo impactos ambientais.
O processo de reciclagem de automóveis no Brasil atualmente envolve sete etapas (de acordo com as informações obtidas no Blog Metagal) desde a análise da documentação até a venda das peças reutilizáveis, levando cerca de três horas para ser concluído.
O processo de reciclagem envolve as seguintes etapas:
- Análise da documentação do veículo;
- Baixa da documentação no Departamento de Trânsito estadual;
- Descontaminação do veículo (remoção de fluidos, óleos e gases);
- Desmontagem e categorização das peças;
- Rastreamento das peças com código digital;
- Separação e armazenamento das peças;
- Expedição e venda das peças reutilizáveis.
Legislação específica não existe
De acordo com a Agência Senado, o senador Confúcio Moura (MDB-RO) empenha-se e cobra para que seu projeto, que cria uma Política Nacional de Reciclagem dos Veículos Usados (PL 4.121/2020), seja votado. O projeto, que prevê a logística reversa de automóveis usados, altera a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) e o Programa de Apoio à Produção de Veículos Automotores (Rota 2030 – Lei 13.755/2018). A proposta beneficia o meio ambiente, protege a saúde e gera emprego e renda.
A Comissão de Meio Ambiente ainda não emitiu recomendações finais sobre o Projeto de Lei 4.121/2020. O projeto está em tramitação e foi distribuído à Senadora Tereza Cristina para elaboração de um relatório. Anteriormente, o senador Esperidião Amin havia apresentado um relatório favorável à aprovação do projeto, com uma emenda substitutiva, mas o processo foi interrompido com o fim da legislatura em 2022.
Enquanto isso, o setor se orienta por regulamentações não específicas existentes
Enquanto não existe uma lei específica para logística reversa e reciclagem de automóveis no Brasil, o setor se orienta por regulamentações existentes, principalmente a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
A Lei 12.305/2010 que institui a PNRS, estabelece diretrizes gerais para a gestão de resíduos sólidos, incluindo veículos em fim de vida útil. Embora não trate especificamente da reciclagem automotiva, a PNRS fornece uma base legal para o gerenciamento de resíduos, incluindo princípios como a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.
A Resolução CONAMA nº 416/2009 trata especificamente da prevenção à degradação ambiental causada por pneus inservíveis e sua destinação ambientalmente adequada. Ela não aborda diretamente a desmontagem de veículos em fim de vida ou regulamenta empresas de desmontagem.
Esta resolução foca em pneus, estabelecendo obrigações para fabricantes e importadores quanto à coleta e destinação de pneus inservíveis. Embora a resolução não trate especificamente de veículos em fim de vida (VFV), ela é relevante para o setor automotivo no que diz respeito ao descarte de pneus. A resolução prevê penalidades para o descarte inadequado de pneus, mas não abrange outros componentes automotivos.
A Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) é responsável pelo licenciamento ambiental de empresas que realizam atividades de desmontagem e reciclagem de veículos. Possui procedimentos específicos para empresas que atuam na desmontagem de veículos em fim de vida útil e comercialização de peças. Isso inclui a emissão de pareceres técnicos para empresas estabelecidas no ramo de desmontagem de veículos.
Lei do Desmanche | 2014
A Lei Federal nº 12.977/14, conhecida como Lei do Desmanche, é aplicável em todo o território nacional. Ela regula e disciplina a atividade de desmontagem de veículos automotores terrestres sujeitos a registro nos termos da Lei nº 9.503 (Código de Trânsito Brasileiro).
Quanto à Lei Estadual nº 15.276/14 de São Paulo, ela é específica para o estado de São Paulo e foi promulgada em 2 de janeiro de 2014, entrando em vigor em 1º de julho do mesmo ano. Esta lei estadual é considerada mais rígida que a lei federal e foi criada para regulamentar a atividade de desmanche de veículos no âmbito do estado de São Paulo. É importante notar que, embora existam leis estaduais específicas como a de São Paulo, a Lei Federal nº 12.977/14 estabelece as normas básicas aplicáveis em todo o país, sendo um marco regulatório nacional para a atividade de desmontagem de veículos.
ProRecicle | 2021
A reciclagem automotiva, embora não seja mencionada na Lei 14.260/2021 (pode se beneficiar significativamente das suas metas e objetivos). Conhecida como Lei de Incentivo à Reciclagem, realmente cria o Fundo de Apoio para Ações Voltadas à Reciclagem (Favorecicle) e os Fundos de Investimentos para Projetos de Reciclagem (ProRecicle). Esta lei estabelece incentivos fiscais e benefícios para projetos que estimulam a cadeia produtiva da reciclagem, com o objetivo de fomentar o uso de matérias-primas recicláveis e promover a economia circular no Brasil.
A reciclagem automotiva pode se beneficiar desta lei de várias formas:
- Dedução fiscal para empresas que apoiam projetos de reciclagem aprovados pelo Ministério do Meio Ambiente.
- Incentivos para o desenvolvimento de novas tecnologias de reciclagem, que podem incluir métodos inovadores para reciclar componentes automotivos.
- Fortalecimento da participação dos catadores de materiais recicláveis, que podem coletar peças automotivas para reciclagem.
Planares | Plano Nacional de Resíduos Sólidos
O Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares, Decreto Nº 11.043, de 13 de abril de 2022) é um importante instrumento da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e tem como função principal estabelecer medidas e metas para implementar a PNRS. Embora o Planares não mencione especificamente a reciclagem automotiva, suas metas e diretrizes gerais criam um ambiente mais favorável para o desenvolvimento e aprimoramento dessa indústria no Brasil. O foco em aumentar a recuperação de resíduos, promover a economia circular e estabelecer metas de longo prazo pode incentivar investimentos e inovações no setor de reciclagem automotiva. Com base nas informações do plano nacional, as principais metas incluem:
- Aumento da recuperação de resíduos: O Planares visa elevar o Índice de Recuperação de Resíduos (IRR) de 2,2% para cerca de 48,1% até 2040. Isso pode incentivar uma maior reciclagem de componentes automotivos.
- Redução do descarte em aterros: A meta de reduzir pela metade o lixo aterrado, priorizando o reaproveitamento através de reciclagem, compostagem e recuperação energética, pode beneficiar a reciclagem de veículos em fim de vida.
- Incentivo à reciclagem de materiais: O plano incentiva a reciclagem de diversos materiais, o que pode incluir metais, plásticos e outros componentes presentes em veículos.
- Economia circular: O Planares promove princípios de economia circular, que são altamente relevantes para a indústria automotiva, incentivando o reaproveitamento de peças e materiais.
- Metas de longo prazo: Com um horizonte de 20 anos e atualizações a cada 4 anos, o plano oferece uma visão de longo prazo que pode orientar investimentos na infraestrutura de reciclagem automotiva.
- Gestão regionalizada: O incentivo à gestão regionalizada dos resíduos sólidos pode facilitar a criação de centros de reciclagem automotiva em diferentes regiões do país.
- Normas e diretrizes: O estabelecimento de normas e diretrizes para a disposição final de rejeitos pode impactar positivamente a gestão de resíduos automotivos.
- Controle e fiscalização: O plano prevê meios de controle e fiscalização, o que pode ajudar a garantir práticas adequadas de reciclagem automotiva.