Incêndios na Mata Atlântica

Pesquisador Bruno Adorno publicou resultados de sua tese do PPGERN/UFSCar (Foto: Arquivo pessoal)
Pesquisador Bruno Adorno publicou resultados de sua tese do PPGERN/UFSCar (Foto: Arquivo pessoal)

Imagem: Divulgação | Pesquisa avalia incêndios florestais no bioma da Mata Atlântica. Estudo aponta que fogo pode estar sendo usado para frear recuperação florestal.

Abril de 2025 – Um estudo realizado na Mata Atlântica, conduzido pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e instituições parceiras, revelou que florestas secundárias – aquelas em processo de regeneração – são os ambientes mais suscetíveis a incêndios. Isso ocorre, provavelmente, devido às características microclimáticas dessas áreas – mais quentes, menos úmidas e com maior radiação solar em comparação às florestas maduras, avaliaram os pesquisadores. 

A pesquisa, desenvolvida entre outubro de 2023 e dezembro de 2024, é fruto da tese de doutorado de Bruno Faria da Cunha Barbosa Adorno, no Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais (PPGERN) da UFSCar, junto a pesquisadores das Universidades Federal de Alfenas (Unifal), Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade de Lisboa. Eles se juntaram para avaliar – a partir da análise de mais de 40 mil incêndios ao longo de 35 anos – quais ambientes são mais vulneráveis à propagação do fogo, para então propor estratégias de conservação dos ambientes. Os resultados foram publicados na revista Journal of Environmental Management.

“Um dos resultados mais surpreendentes – e também preocupantes – da nossa pesquisa”, revela Bruno Adorno – principal autor do artigo -, “foi constatar que o fogo tende a se propagar com mais facilidade em florestas mais jovens”. Esse achado, segundo ele, tem duas implicações importantes: primeiro, ele mostra que essas áreas em regeneração são extremamente vulneráveis ao fogo, o que pode comprometer seriamente os esforços de restauração da Mata Atlântica.

Segundo, há indícios de que esses ambientes estejam sendo intencionalmente incendiados para impedir que avancem para estágios mais maduros de sucessão ecológica.

“Isso porque, quanto mais antigas e estruturadas essas florestas se tornam, mais protegidas elas ficam pela legislação ambiental. Ou seja, o fogo pode estar sendo usado como uma ferramenta para frear a recuperação florestal – o que, além de ilegal, é extremamente grave do ponto de vista ecológico”, alerta o pesquisador da UFSCar.

Fogo na Mata Atlântica

Quais são as principais causas do fogo na Mata Atlântica? “Como na maioria das florestas tropicais”, responde Adorno, “esses incêndios são provenientes de práticas agrícolas associadas ao fogo. Tais práticas – muitas vezes criminosas – consistem no uso do fogo para a limpeza de terrenos e pastagens. Em alguns casos, o fogo também é utilizado para extinguir áreas de vegetação nativa e, consequentemente, criar novas áreas de cultivo”. Além disso, incêndios acidentais também podem ocorrer, seja a partir da queima do lixo, bitucas de cigarro e faíscas de veículos e máquinas agrícolas, completa o pesquisador. “Todas essas causas são intensificadas em épocas de baixa precipitação e tendem a aumentar com as mudanças climáticas”.

A Mata Atlântica resgata o estudo é um dos biomas mais ameaçados do Brasil e vem sendo degradada desde os tempos coloniais. Além de ameaças como o desmatamento e a fragmentação florestal, o bioma também enfrenta problemas relacionados ao fogo, que tendem a aumentar com as mudanças climáticas e períodos de estiagem prolongados. De acordo com o MapBiomas – citada pelos pesquisadores -, mais de 7 milhões de hectares do bioma foram atingidos pelo fogo nos últimos 40 anos. 

Métodos e materiais da pesquisa

Os pesquisadores buscaram avaliar quais os tipos de ambientes mais vulneráveis à propagação do fogo. Para isso, foi utilizado um método baseado em um índice de proporções. Nele, dois tipos de mapa foram considerados. Um deles são os mapas de uso do solo, que “caracterizam as regiões. Com esses mapas, podemos avaliar a quantidade de cada tipo de ambiente nos locais, como pastagens, florestas, áreas urbanas, plantações, etc.”, aponta o doutor em Ecologia pela UFSCar.

Também foram consultados mapas de cicatrizes de fogo. “Cicatrizes de fogo são como ‘assinaturas’ deixadas por incêndios na vegetação. A intensidade de cada incêndio influencia diretamente a perda de água e matéria orgânica, alterando as características biofísicas da vegetação. Essas alterações podem ser detectadas por sensores remotos, permitindo a delimitação das áreas queimadas por meio de imagens de satélite”, detalha o pesquisador.

Políticas de manejo e conservação

Como resultado, os pesquisadores descobriram que as florestas mais jovens, ou seja, as florestas secundárias, são mais suscetíveis a sofrer com as queimadas. Esses achados têm implicações diretas para apontar políticas de manejo e conservação: áreas com grandes extensões de vegetação secundária, especialmente em estágios iniciais de regeneração, devem ser prioritárias em estratégias de combate ao fogo. Conforme essas florestas se regeneram, elas não apenas se tornam mais resistentes ao fogo, mas também desempenham um papel essencial no sequestro de carbono, ajudando a mitigar os impactos das mudanças climáticas.

Segundo Érica Hasui, professora da Unifal e uma das autoras, “o estudo pode auxiliar os tomadores de decisão no planejamento de políticas para a prevenção e combate ao fogo, algo fundamental diante das mudanças climáticas e do aumento da atividade de fogo”. Para Milton C. Ribeiro, professor da Unesp (campus de Rio Claro) e coautor do artigo, “os próximos passos envolvem o monitoramento das florestas secundárias incendiadas para avaliar sua capacidade de regeneração”. 

Conservação de aves

Além de diminuir os incêndios, o trabalho também contribui para apontar ações de conservação das aves da Mata Atlântica. “As florestas secundárias – que atualmente compõem grande parte da vegetação remanescente e das áreas em restauração – apresentam maior propensão ao fogo, o que compromete a persistência das aves de diversas formas. A ocorrência de incêndios prejudica a estruturação da floresta, afetando especialmente as espécies mais especializadas, devido à redução do tamanho e ao aumento do isolamento dos fragmentos remanescentes”, analisa João Augusto Piratelli, professor do Departamento de Ciências Ambientais (DCA-So) do Campus Sorocaba da UFSCar e orientador do estudo.

Nesse contexto, os pesquisadores entendem que é fundamental o fortalecimento de políticas públicas voltadas à prevenção do desmatamento e ao combate aos incêndios ilegais – estratégias essenciais para a manutenção dos serviços ecossistêmicos prestados pelas aves neste bioma.

“Assim, no contexto da emergência climática, é urgente a necessidade de proteção dessas áreas. Garantir sua conservação não só fortalece a resiliência desse bioma contra incêndios, mas também contribui para o equilíbrio climático global”, concluem.

Financiamento e contatos

O estudo foi financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e faz parte do Programa de Ecologia de Longa Duração do Corredor Cantareira Mantiqueira (PELD CCM), um conjunto de pesquisas que têm, dentre seus objetivos, a conservação dessa região tão importante da Mata Atlântica. 

Site Oficial: https://www.ufscar.br

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