SÉRIE TRILOGIA DA POTABILIDADE DE ÁGUA: PASSADO –  A história e a evolução das portarias de potabilidade

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TRIOLOGIA DA POTABILIDADE DA ÁGUA NO BRASIL: PASSADO, PRESENTE E FUTURO
TRIOLOGIA DA POTABILIDADE DA ÁGUA NO BRASIL: PASSADO, PRESENTE E FUTURO

Imagem: SÉRIE TRILOGIA – POTABILIDADE DA ÁGUA NO BRASIL: Passado, Presente e Futuro – Redação em 23/06/2021

Autoria da Eng. Roseane Maria Garcia Lopes de Souza, Engenheira Sanitarista e Ambiental, diretora da ABES e coordenadora das Câmara Técnicas de Resíduos Sólidos e Saúde Pública e especialistas colaboradores

TRILOGIA COMPLETA DA POTABILIDADE DE ÁGUA NO BRASIL


PARTE 1 – PASSADO – HISTÓRIA E EVOLUÇÃO

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Segundo registros do Ministério da Saúde, a atenção das autoridades de saúde do Brasil sobre a qualidade da água para consumo humano surgiu a partir da década de 1920, com a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP). Ele foi instituído pelo Decreto-Lei n° 3.987, com base no que então se denominava “Reforma Carlos Chagas” que reorganizou os serviços de saúde do país.

O DNSP era composto por três diretorias: dos Serviços Sanitários do Distrito Federal, de Defesa Sanitária Marítima e Fluvial e de Saneamento Rural.

Curioso notar que só algumas décadas depois o Governo Federal estabeleceu normas mais abrangentes sobre defesa e proteção à saúde, ao promulgar o Código Nacional de Saúde, por meio do Decreto n° 49.974/1961, que regulamentou a Lei n°2.314/1954. Este Código incorporou novos objetos à área de abrangência do que hoje se denomina vigilância sanitária e vigilância ambiental, entre elas o saneamento e a proteção ambiental. É nele que possivelmente aparece pela primeira vez o termo “risco” na legislação sanitária:

Art. 52° – com o fim de evitar os riscos da saúde inerentes ao trabalho, o Ministério da Saúde estabelecerás as medidas a serem adotadas. Art. 65, § 2º – o registro e o licenciamento de inseticidas destinadas à agricultura dependem de prévia manifestação do órgão federal de saúde competente, sobre os riscos que possam acarretar à saúde humana.

Mas foi na década de 1970 que se atribuiu competência ao Ministério da Saúde para elaborar normas e o padrão de potabilidade de água para consumo humano a serem observados em todo o território nacional. Isto se deu pelo Decreto Federal 79.367/1977, cuja fundamentação provem da Lei n°. 6.229/1975, que dispunha sobre o Sistema Nacional de Saúde, e também da 1ª Conferência Pan-Americana sobre qualidade de água, realizada em São Paulo em outubro de 1975.

O decreto definia ainda competências ao Ministério da Saúde, articulado com os Estados, Distrito Federal e Territórios, para fiscalizar o cumprimento de suas normas. Além disto, pelo texto legal cabia ao Ministério, em articulação com outros órgãos e entidades, a elaboração de normas sanitárias sobre proteção de mananciais; serviços de abastecimento de água; instalações prediais de água e controle de qualidade de água de sistemas de abastecimento público.

O mesmo Decreto n° 79.367/1977 determinava que os órgãos e entidades dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios, responsáveis pela operação dos sistemas de abastecimento público, deviam adotar obrigatoriamente as normas e o padrão de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde.

Foi com base neste Decreto que o Ministério da Saúde elaborou e aprovou uma série de legislações referentes à água para consumo humano, entre elas, normas e padrão sobre fluoretação de águas de sistemas públicos de abastecimento destinado ao consumo humano, aprovada pela Portaria 635 Bsb, de 26/12/1975, conforme estabelecido na Lei n° 6.050 de 24/05/1974 (que dispõe sobre a fluoretação da água em sistemas de abastecimento quando existir estação de tratamento) e o Decreto Federal n.° 76.872, de 22/12/1975, que o regulamenta; normas e o padrão de potabilidade de água para consumo humano, aprovada pela Portaria n.° 56/Bsb/1977 e que se constituiria na primeira legislação federal brasileira sobre potabilidade de água para consumo humano editada pelo Ministério da Saúde. Além disso, foram editadas normas sobre proteção sanitária dos mananciais, dos serviços de abastecimento público e seu controle de qualidade e das instalações prediais, aprovadas pela Portaria n° 443/Bsb/1978, ainda em vigor.

EVOLUÇÃO DAS LEGISLAÇÕES SOBRE POTABILIDADE DE ÁGUA

a. Portaria 56 Bsb de 14/3/1977

A Portaria n.°56/Bsb/1977 (Bsb significa Brasil/Brasília) estabelecia e padrão bacteriológico, físico-químico e radiológico que água deveria ter para ser considerada potável.

O padrão físico era constituído por cor turbidez, odor e sabor e o padrão químico por 20 elementos e substância químicas inorgânicas e 13 substâncias químicas orgânicas, divididos em biocidas orgânicos sintéticos hidrocarbonetos clorados e compostos organofosforados e carbamatos.

Interessante notar que a Portaria 56Bsb/1977 definia para o padrão físico-químico e elementos/ substâncias químicas dois valores de referência – VMD (valor máximo desejável) e VMP (valor máximo permitido).

Definiu-se os valores a serem obedecidos para o Flúor em função da temperatura do ar, considerando a exigência da fluoretação das águas distribuídas por sistemas de abastecimento público, para prevenção da cárie dentária;

O padrão bacteriológico definia limites apenas para bactérias do grupo Coliforme, estabelecendo o máximo permitido em função dos resultados realizados no plano de amostragem.

A legislação definia o número mínimo de amostras e sua frequência de coleta para avaliação da qualidade da água dos sistemas de abastecimento, a saber:

  • Para parâmetros físicos levando em consideração duas situações: sem tratamento e laboratório e com tratamento e laboratório;
  • Para parâmetros químicos, divididos em 2 categorias: aqueles que apresentam risco potencial para a saúde e aquelas que afetam a aceitabilidade da água;
  • Para avaliação bacteriológica e número de amostras e a e não frequência de sua coleta, era determinada pela população total da comunidade e não pela população abastecida pelo sistema;
  • A avaliação da característica radiológica da água, a legislação deixava sua definição em função da existência de causas de radiação natural ou decorrentes de atividades humanas que pudessem comprometer a qualidade da água.

Finalmente a Portaria 56 Bsb/1977 permitia que cada estado da federação adotasse padrão mais restritivo dependendo das condições locais e caso não fosse possível distribuir água dentro do padrão estabelecido na legislação, o órgão de saúde competente – ouvido o Ministério da Saúde – poderia autorizar o consumo da água à título precário, estabelecendo prazo para que medidas corretivas fossem adotadas.

b. Portaria 36 GM de 19/01/1990

Em 1988 o Ministério da Saúde promoveu em Florianópolis um encontro com todas as secretarias de Saúde do Brasil, as empresas estaduais de saneamento e os órgãos de controle ambiental. O objetivo era discutir o papel do setor saúde na fiscalização e acompanhamento da qualidade da água destinada ao consumo humano.

Surgia o conceito de Vigilância da Qualidade da Água para consumo humano.

Além de outros assuntos tratados como a estruturação das Secretarias Estaduais de Saúde para fazer frente a esta atribuição, foi consenso geral sobre a necessidade de rever a Portaria 56Bsb/1977.

O Ministério da Saúde deu início a um processo de discussão em todo o Brasil, que resultou na publicação da Portaria 36 GM/1990 que teve como principais avanços:

Caráter geral

  • Definições – surgem as terminologias de Vigilância e Controle da qualidade da água para consumo humano. Também são definidos os termos Serviço e Sistema de abastecimento de água;
  • Laboratório – surge a figura do laboratório cerificado pelo Ministério da Saúde ou pela autoridade sanitária dos Estados e Distrito Federal;
  • Relatórios mensais – os Serviços de abastecimento de água deveriam enviar relatórios mensais às Secretarias Estaduais de Saúde para comprovar o cumprimento da legislação.

Parâmetros de potabilidade

  • Os parâmetros físico-químicos e elementos/substâncias químicas passam a ter apenas os VMP (valores máximos permitidos);
  • Definiu-se VMP do parâmetro turbidez na entrada do sistema e na rede de distribuição;
  • Bacteriologia – além do padrão para bactérias do grupo Coliforme, acrescentou a exigência de ausência para Coliformes fecais ou Coliformes termo tolerantes.
  • Também definiu o número máximo permitido para bactérias heterotróficas. Foi previsto padrão bacteriológico para águas distribuídas sem canalização e sem tratamento;
  • Atualização de todos os parâmetros face aos conhecimentos técnicos e científicos referente ao risco e impacto dos elementos e substâncias químicas na saúde humana;
  • Ampliação dos elementos e substâncias químicas a serem analisa dos 11(onze) elementos e substâncias químicas inorgânicas, 20 (vinte) componentes orgânicos que afetam a saúde e 10 (dez) componentes que afetam a qualidade organoléptica da água.

Outras exigências e recomendações

  • Adoção de limite para o pH da água a ser consumida;
  • Definição do teor mínimo de CRL (cloro residual livre) a ser mantido na rede de distribuição;
  • Proibição de ocorrência de substâncias que confiram odor característico à agua, mesmo que não represente risco à saúde humana;
  • Recomendou-se que fosse feito uma avaliação em cada Estado e DF para verificar os níveis de radioatividade nos mananciais de abastecimento de água;
  • A legislação proibiu a operação no sistema de abastecimento de água que permita a existência de pressão negativa na rede de distribuição;
  • Foi prevista a possibilidade de fornecimento de água fora do padrão estabelecido, desde que não coloque em risco a saúde da população.

Amostragem

Houve uma mudança significativa na proposta de amostragem para avaliação da qualidade da água, visando verificar o atendimento ao padrão de potabilidade estabelecido na Portaria 36 GM/1991, a saber:

  • Estabeleceu-se o número de amostras e sua frequência de coleta na entrada e rede de distribuição, para avaliação dos parâmetros físico-químicos, em função da população abastecida;
  • A amostragem para verificação do padrão bacteriológico foi definida em função da população abastecida;

c. Portaria 1.469 de 29/12/2000

Dez anos passados desde a publicação da Portaria 36 GM/1991, o Ministério da Saúde, por meio da Fundação Nacional de Saúde – FUNASA, com o apoio da Organização Pan-americana de Saúde – OPAS, promoveu a revisão da legislação de potabilidade de água para consumo humano. Foi a mais ampla revisão feita até então, que contou com uma equipe de consultores oriundos de Laboratório, órgão ambiental, saúde e universidade. Uma vez elaborado o texto base, este foi objeto de oficinas realizadas nas cinco regiões do Brasil, consulta por internet e uma oficina final em Brasília.

Como principais mudanças efetuadas na legislação de potabilidade de água, apresentamos:

Caráter geral

  • Definições – além de definir “sistema de abastecimento de água para consumo humano”, a Portaria define “solução alternativa de abastecimento de água para consumo humano”
  • Deveres e Responsabilidades – pela primeira vez a legislação define os deveres e responsabilidades do setor saúde nos 3 níveis de governo no que se refere à vigilância da qualidade da água para consumo humano e dos responsáveis pela operação dos sistemas e soluções alternativas de abastecimento de água;
  • Penalidades – a portaria estabeleceu penalidades no caso de descumprimento da legislação.

Parâmetros de potabilidade

  • O padrão bacteriológico para Coliformes totais depende do número de amostras a serem coletadas no sistema;
  • Definiu-se padrão para cianobactérias;
  • Atualização de todos os parâmetros face aos conhecimentos técnicos e científicos referente ao risco e impacto dos elementos e substâncias químicas na saúde humana;
  • Ampliação dos elementos e substâncias químicas a serem analisados -13 elementos e substâncias químicas inorgânicas, 34 componentes orgânicos que afetam a saúde e 16 componentes que afetam a qualidade organoléptica da água;
  • Estabeleceu-se VMP para desinfetantes e produtos secundários da desinfecção.

Outras exigências e recomendações

  • Adotou a exigência do processo de filtração em sistemas abastecidos por manancial de superfície e que distribuam água por canalização;
  • Definiu-se o VMP para turbidez para a água pós-filtração ou pré-desinfecção em função do tipo de água (subterrânea) e o tipo de filtro utilizado (rápido ou lento);
  • Além da manutenção de teor mínimo de CRL na rede de distribuição, estabelece use o teor mínimo a ser mantido após o processo de desinfecção. O teor máximo de CRL na rede de distribuição também foi definido;
  • Em função da quantidade de cianobactérias encontradas no manancial, recomendou-se análise de ciano toxinas na saída do tratamento dos sistemas, nas clínicas de tratamento por hemodiálise e indústrias de injetáveis;
  • A legislação introduziu exigências para o fornecimento de água por meio de veículo transportador.

Amostragem

  • A amostragem mínima a ser exigida para o controle de qualidade, objetivando verificar o atendimento ao padrão físico-químico, foi definido em função do tipo de manancial abastecedor – superficial ou subterrâneo. O mesmo não ocorreu para o plano de amostragem para verificação do padrão microbiológico;
  • Foi definido um plano de amostragem diferenciado para o controle de qualidade das soluções alternativas de abastecimento de água, visando avaliação do atendimento ao padrão físico-químico e bacteriológico.

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