Vamos falar de Geotecnia #4: O papel fundamental do ‘Ensaio SPT’, regulamentada no Brasil pela norma NBR 6484

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Engenheiro civil Arthur Teixeira Askinis, colunista
Engenheiro civil Arthur Teixeira Askinis, colunista

Imagem: Divulgação | Por Arthur Teixeira Askinis, Engenheiro Civil formado pela FEI (2015) e especialista em Fundações e Geotecnia em obras imobiliárias pelo Instituto Mauá de Tecnologia. Atualmente é coordenador da Divisão Técnica de Geotecnia do Instituto de Engenharia

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Fevereiro de 2024 – Na engenharia geotécnica, a caracterização precisa das propriedades do solo é fundamental para o sucesso de diversos tipos de projetos. Nesse contexto, o Ensaio Standard Penetration Test (SPT) destaca-se como uma ferramenta amplamente adotada, fornecendo informações valiosas sobre as condições do solo.

No Brasil, a execução desse ensaio é regulamentada pela norma NBR 6484, intitulada “Sondagens de simples reconhecimento com SPT – Método de ensaio”, que estabelece diretrizes específicas para sua realização.

Importância ambiental do ‘Ensaio SPT’ na engenharia civil

O Ensaio Standard Penetration Test (SPT) desempenha um papel fundamental na promoção da sustentabilidade e na redução do impacto ambiental das atividades de engenharia civil. Ao fornecer dados precisos sobre as características do solo, o SPT ajuda a garantir que as obras sejam planejadas e executadas de forma responsável, respeitando o meio ambiente e contribuindo para a conservação dos recursos naturais.

  1. Preservação de Ecossistemas Sensíveis: Antes de iniciar qualquer obra de engenharia civil, é fundamental entender as características do solo para minimizar o impacto ambiental. O SPT fornece informações geotécnicas essenciais que ajudam os engenheiros a projetar estruturas de forma a preservar ecossistemas sensíveis, como áreas de manguezais, florestas tropicais, e habitats de espécies ameaçadas.
  2. Evitar Contaminação do Solo e da Água: A análise geotécnica fornecida pelo SPT ajuda a evitar a contaminação do solo e da água durante a construção e operação de infraestruturas. Ao compreender a composição e a permeabilidade do solo, os engenheiros podem implementar medidas de proteção adequadas para prevenir vazamentos de substâncias tóxicas e minimizar o risco de poluição.
  3. Gestão de Resíduos e Recursos Naturais: O conhecimento geotécnico adquirido por meio do SPT pode orientar práticas de gestão de resíduos e recursos naturais durante as obras. Isso inclui a seleção de locais adequados para a disposição de resíduos sólidos e líquidos, bem como a identificação de áreas onde recursos naturais, como água subterrânea, podem ser protegidos e preservados.
  4. Mitigação de Riscos Geotécnicos Ambientais: O ensaio SPT fornece informações valiosas sobre a estabilidade do solo, ajudando a identificar e mitigar riscos geotécnicos que podem afetar o meio ambiente. Isso inclui o mapeamento de áreas propensas a deslizamentos de terra, erosão e inundações, e a implementação de medidas de prevenção para proteger ecossistemas frágeis e comunidades humanas.

Execução do Ensaio

O SPT é conduzido utilizando um equipamento básico conhecido como tripé de sondagem, composto por componentes essenciais para a execução precisa do ensaio. Um dos elementos-chave desse processo é o martelo de 65kg, projetado para realizar quedas livres de 75cm. Essa energia controlada é aplicada para cravar um amostrador padrão no solo, justificando assim a designação “Standard Penetration Test”.

A execução do ensaio pode ser realizada de forma manual ou mecanizada, dependendo das condições específicas do local e da disponibilidade de recursos. Ambas as abordagens possuem vantagens e limitações, sendo importante considerar fatores como a profundidade do ensaio, as características do solo e a precisão necessária na coleta dos dados.

Exemplo real de Esquema da sondagem SPT

Gráfico ilustrativo
Foto: Sondagem SPT no terreno do Instituto de Engenharia, São Paulo

A partir da padronização estabelecida pela norma NBR 6484, torna-se possível garantir a consistência e a confiabilidade dos resultados obtidos por meio do Ensaio SPT. Essa uniformidade facilita a comparação de dados entre diferentes projetos e localidades, contribuindo para o avanço da engenharia geotécnica no Brasil.

Informações obtidas

O ensaio forneceu três dados cruciais:

  1. Posição do nível d’água.
  2. Número de golpes (N SPT).
  3. Classificação tátil-visual do solo.

Interpretação dos Resultados

Durante a cravação do amostrador, a contagem dos golpes é realizada para cada segmento de 15cm. Por exemplo, se os golpes necessários foram 7, 8 e 11 para os três segmentos, respectivamente, o N SPT será 19 golpes/30cm.
7/15; 8/15; 11/15; Nspt=19

Variações e Casos Especiais

Caso haja deslocamento superior a 15cm com um único golpe, é registrado como 1/27. Da mesma forma, deslocamentos devido ao peso da haste ou do martelo são anotados como com o peso da haste se desloca 10cm notaria PH/10. Ou apoiando o martelo desloca 13 seria registrado PM/13.
Situações em que o martelo não penetra os 15cm são registradas como 35/9, indicando 35 golpes com um deslocamento de 9cm. Em função do tipo de solo (argiloso/silte argiloso ou arenoso/silte arenoso) e o Nspt com a norma NBR 6484 pode-se falar na compacidade ou consistência.

Fonte: NBR 6484

Além do Ensaio Standard Penetration Test (SPT) fornecer dados essenciais para classificação da amostra, é crucial considerar a origem do solo. Seja ele um solo residual, proveniente de aluviões, composto por argila orgânica, ou até mesmo saprólito, cada origem carrega consigo características distintas que exercem influência direta sobre seu comportamento geotécnico. Essa informação transcende a simples observação da cor do solo, oferecendo insights valiosos sobre sua formação, história geológica e variações em suas propriedades físicas e mecânicas.

Aplicações do Ensaio Standard Penetration Test (SPT)

O Ensaio Standard Penetration Test (SPT) é amplamente utilizado em diversas finalidades de aplicação e preparação do solo, incluindo:

  1. Fundações: O Ensaio SPT é amplamente empregado na área de fundações, sendo fundamental para o cálculo da capacidade de carga. O valor do Nspt e a classificação do solo são elementos-chave para a aplicação de métodos semiempíricos, como os renomados Aoki-Velloso, Decourt-Quaresma e Urbano Alonso. Embora mereça uma discussão detalhada em outra ocasião, é importante ressaltar que, munido dos resultados do Ensaio SPT, é possível realizar um projeto de fundação. No entanto, é válido destacar que projetos com requisitos especiais podem demandar uma maior quantidade de ensaios para uma análise mais precisa.
  2. Estabilidade de Taludes: No contexto da estabilidade de taludes, as sondagens SPT desempenham um papel fundamental ao serem utilizadas, muitas vezes por meio de correlações, para determinar parâmetros como o ângulo de atrito e a coesão do solo. É essencial destacar a importância de utilizar referências locais sempre que possível, ou seja, correlacionar os dados com estudos de solos representativos da região onde o ensaio foi realizado, seja próximo à obra ou com características semelhantes. É essencial alertar que, por exemplo, uma areia argilosa com valor de Nspt 15 em três regiões distintas do país pode apresentar propriedades muito diferentes. Com uma análise embasada em referências confiáveis, é viável estimar a coesão, o ângulo de atrito e o nível d’água, permitindo calcular os fatores de segurança necessários para as encostas. Além disso, há uma variedade de tópicos relacionados ao Ensaio SPT que poderão ser abordados eventualmente, como o SPT-T, que incorpora o torque, e questões relacionadas à energia no Ensaio SPT, entre outros assuntos.
  3. Avaliação de Riscos Geotécnicos: O conhecimento das propriedades do solo obtido por meio do ensaio SPT é essencial para avaliar os riscos geotécnicos em áreas sujeitas a fenômenos como erosão, inundação e deslizamentos de terra. Com base nos resultados do ensaio, é possível identificar áreas vulneráveis e implementar medidas de mitigação de riscos, visando proteger vidas e propriedades.
  4. Planejamento de Obras de Engenharia: O ensaio SPT fornece dados geotécnicos essenciais para o planejamento e execução de obras de engenharia civil, como estradas, ferrovias, aeroportos e túneis. Os resultados do ensaio são utilizados para avaliar a viabilidade técnica e econômica dos projetos, identificar possíveis problemas geotécnicos e definir as estratégias de construção mais adequadas.

Interpretação Física do Ensaio SPT

O Professor Nelson Aoki introduz uma significativa inovação no Ensaio SPT: a interpretação física desse método. Anteriormente, discutimos sua aplicação com base em métodos semiempíricos e correlações derivadas da experiência. No entanto, é possível realizar uma análise física do ensaio utilizando o princípio da conservação de energia de Hamilton e a teoria da equação da onda [1].

A proposta do Professor Aoki envolve a realização de uma prova de carga durante o ensaio SPT, em uma camada na qual a reação da prova de carga possa ser aplicada, por exemplo, na traseira de um caminhão.

Isso significa uma prova de carga de baixíssimo custo e acessível, os equipamentos necessários são simples.  Com a prova de carga em mãos conseguimos separar forças conservativas (ponta) e forças não conservativas (atrito).

Foto: Prova de Carga na traseira de um caminhão

Análise da prova de carga e eficiência

Gráfico

Com a medida do solo no amostrador em função do embuchamento é possível separar a resistência de ponta e atrito no SPT. Isso significa elevarmos o ensaio SPT que nos fornece como medida de resistência o Nspt a um ensaio que avalia resistência de ponta e atrito.

Foto: Arquivo pessoal | Amostra de solo embuchado no amostrador
Fonte: Fundações: Ensaios estáticos e dinâmicos

Inclusive essa interpretação física é tão notável que foi reconhecida internacionalmente também pelo Me. Engº Geol. Piergiuseppe Froldi em “La prova SPT (Standard Penetration Test): dall’energia dinamica alla Forza Statica Equivalente”. Como sugestão de leitura, livro “Fundações Ensaios estáticos e dinâmicos”, capítulo 2 chamado “Inovação no SPT”.

Esse reconhecimento internacional mostra a força dessa inovação e como o Ensaio SPT ganha uma nova proporção. Gostaria de homenagear o Professor Nelson Aoki e todos os engenheiros que se dedicam a pesquisas que valorizam a nossa engenharia e em especial a geotecnia brasileira.

Como sugestão em vídeo, recomendo que assistam o webinar “Avanços na norma do SPT – NBR 6484/2020” com os engenheiros Artur Quaresma e Fernando Penna. 

Sobre o colunista

Arthur Teixeira Askinis é Engenheiro Civil especializado em Geotecnia.
Arthur Teixeira Askinis é Engenheiro Civil especializado em Geotecnia.

Arthur Teixeira Askinis é um Engenheiro Civil formado pela FEI (2015) e especialista em Fundações e Geotecnia em obras imobiliárias pelo Instituto Mauá de Tecnologia. Atualmente atua como coordenador da Divisão Técnica de Geotecnia do Instituto de Engenharia, promovendo palestras e simpósios sobre o tema, evidenciando seu compromisso com a disseminação de conhecimento e avanço na área de engenharia geotécnica.

Perfil do Arthur Teixeira Askinis no LinkedIn.

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Referência:
[1] Sobre o Princípio da Conservação de Energia de Hamilton e equação da ondaO Princípio da Conservação de Energia de Hamilton, derivado da mecânica clássica, afirma que a energia total de um sistema permanece constante ao longo do tempo, desde que não haja forças dissipativas externas. Ele está intimamente ligado à mecânica analítica e à teoria da equação da onda, que descreve a propagação de diferentes tipos de ondas, como sonoras e eletromagnéticas. Embora esses conceitos estejam enraizados na física, sua conexão específica pode ser explorada mais profundamente por meio de estudos em mecânica analítica e física matemática. Para mais informações sobre o Princípio da Conservação de Energia de Hamilton, consulte o artigo relacionado na Wikipedia: Princípio da Conservação de Energia de Hamilton. Para explorar a teoria da equação da onda, visite o seguinte link: Equação da Onda.

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Crédito:
AMBIENTAL MERCANTIL | Por Por Arthur Teixeira Askinis, colunista e colaborador

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